Sinopse: Harlem, Nova York, década de 1930. John Grimes acorda no dia do seu aniversário de catorze anos e ninguém ao redor parece se lembrar da data. Apesar do entorno apático e por vezes violento, o protagonista não abandona seu otimismo. É então que ele percebe que a fé pode dar um novo rumo para a sua vida e decide mergulhar em uma profunda jornada espiritual.
A minha assinatura na TAG Curadoria em 2025 iniciou em janeiro com uma indicação do escritor brasileiro Itamar Vieira Junior, que escolheu Proclamem nas montanhas do autor norte-americano James Baldwin. Como mimo o já tradicional planner.
Proclamem nas montanhas se divide entre o presente e o passado. No tempo atual, ele cobre as 24 horas do dia do aniversário de John Grimes, onde nem todos parecem lembrar que o jovem está completando quatorze anos, enquanto ele mesmo, ao ser obrigado a ajudar na organização da igreja frequentada pela sua família, que terá uma cerimônia religiosa mais tarde, tem dúvidas quanto as próprias crenças.
Além disso há o seu irmão mais novo Roy, que com sua rebeldia e constante busca por problemas, sempre chama atenção do seu pai, Gabriel, que não esconde a preferência pelo filho, mesmo quando este faz coisas erradas.
Foi só na manhã do dia em que completou catorze anos que realmente começou a pensar nisso, e àquela altura já era tarde demais.
Nos flashbacks descobrimos a origem da família que é ao mesmo tempo muito religiosa e um tanto disfuncional, principalmente pelas atitudes do patriarca. Ao qual amores, hipocrisias e uma pitada de história é relatada por Gabriel, Elizabeth - mãe de John - que se abraçou a igreja após uma grande perda, e Florence, a irmã de Gabriel e uma mulher que é ao mesmo tempo muito independente e ressentida pela forma como foi se encaminhando a sua vida.
Tudo em um romance que explora principalmente o papel da religião nos laços familiares, nos conflitos internos, no perdão dos erros, na sexualidade e dentro da comunidade negra nos anos de 1930 nos Estados Unidos.
A escrita de James Baldwin
O norte-americano James Baldwin nasceu no Harlem em 1924, reconhecido por seus romances e ensaios, foi bastante participativo no movimento dos direitos civis, sendo considerado hoje um dos maiores escritores norte-americanos do século XX.
Através da escrita ele abordou assuntos como sexualidade, racismo, identidade, amor, injustiça social, religião e tudo o que cerca e determina a figura do ser humano.
Aquela longa estrada, sua vida, que ela seguia havia sessenta dolorosos anos, a levara por fim ao ponto de partida de sua mãe, o altar do Senhor.
E eles são a base de Proclamem nas montanhas, que além de ser o seu primeiro romance possui um toque autobiográfico, já que assim como John, James Baldwin não conheceu o pai, e seu padrasto era um membro constante da igreja, e conforme ele crescia, se distanciava das crenças.
Em relação à forma narrativa, em Proclame nas montanhas ele opta em utilizar a terceira pessoa com foco em quatro personagens. O que permite ao leitor uma visão ampliada da dinâmica familiar, assim como dos segredos e traumas que levaram os personagens até aquele dia.
Logo alguém voltaria a gritar, e as vozes recomeçariam; haveria música, e brados, e o som dos pandeiros.
Para esta última parte, o uso de flashbacks e de retorno do tempo foram fundamentais para entender principalmente os três personagens adultos, que inclusive possuem capítulos próprios para contarem um pouco da sua trajetória.
Em comum entre os quatro está a religião, que é uma mistura de quinto personagem e base do livro, já que sim, tudo se desenrola através das relações com ela, seja por conflitos espirituais, descrença ou orações e sermões.
Pensava nele agora, enquanto a cantoria e o choro prosseguiam a sua volta - e pensava o quanto o pai gostaria do neto, que era parecido com ele sob tantos aspectos.
O resultado deste conjunto é que o leitor será colocado vivenciando aquelas horas dentro da comunidade, permitindo assim que ele tenha as próprias ideias e opiniões sobre o que estava ocorrendo.
O que eu achei de Proclamem nas montanhas
Já havia ouvido falar sobre o escritor James Baldwin, mas não havia lido nada ainda. E isso me fez ter uma grande expectativa em relação ao livro que seria enviado.
Mas confesso que achei a parte do John bastante arrastada, a forma como os sermões, citações e experiências religiosas apareciam em sequência não me convidavam a ler mais uma página.
Terra balançava, transformando o espaço num vazio absoluto, levando o caos à ordem, ao equilíbrio, ao tempo.
Como a parte do John é autobiográfica, fiquei pensando se não foi isso que pesou um pouco na escrita, já que as vezes é mais fácil falar do que é ficção do que é real. Ou tenha sido uma forma do autor expurgar o que consumia sua mente a muito tempo. Enfim, minhas teorias, que de fato não tem nada.
Em compensação os capítulos do Gabriel, da Elizabeth e da Florence eu achei muito mais interessante, a escrita também me parecia mais fluída e convidativa a entrar no passado dos três, cujas escolhas levaram todos até aquele dia.
Apavorado, começou a chorar e gemer - e esse som foi engolido, e, apesar disso, amplificado pelos ecos que enchiam a escuridão.
Também gostei da forma como Baldwin abordou o critério de algumas religiões de abraçar a todos, independente dos seus pecados, para que estes se tornem puros. Mas sem deixar de mostrar a hipocrisia dos que se intitulam escolhidos de seguirem praticando suas maldades, e achar que basta orar para tudo ser esquecido.
Na parte histórica, ele aborda no romance o fim da escravatura, a mãe de Gabriel e Florence foi uma escrava e é uma recém liberta, assim como o surgimento de grupos discriminatórios e a raiva que se sentia pelas pessoas de cor branca.
Pelo visto, não tem uma mulher neste mundo que não foi passada pra trás por um homem que não presta.
Em relação à parte familiar, ele aborda diferentes tipos de relação e seus conflitos, onde há o filho preferido, o filho abandonado, a rivalidade entre irmãos, a mágoa da mãe, o seguir caminhos que não se sente como seu.
Então sim, ele aborda inúmeros assuntos que são muito interessantes, mas infelizmente, no meu caso, o estilo narrativo não me conquistou. Mas como ele pode ganhar o seu coração, ou levar a várias reflexões - como aconteceu comigo - deixo aqui a dica.
Tradução Paulo Henrique Britto
TAG - Companhia das Letras
2025 - 271 páginas
Publicado originalmente em 1953