Sinopse: Tentando ganhar a vida como puxador de riquixá, uma espécie de carroça, o inocente Xiangzi vai em busca da utopia da cidade grande. Na Beijing dos anos 1920, Xiangzi enfrenta as mais diversas situações, navegando a guerra, figuras oportunistas, perigos e desilusões. Escrito por Lao She, um dos escritores mais relevantes da China moderna, O garoto do riquixá se tornou um símbolo de resistência e da odisseia que o país enfrentou no século XX.
No mês de fevereiro/2024 recebi da minha assinatura da TAG Curadoria a indicação do advogado Pedro Pacífico O Garoto do Riquixá do autor chinês Lao She. O mimo foi um dos mais estranhos recebidos nestes anos de assinatura: uma espécie de pratinho, que lembra um cinzeiro, e é descrito para guardar miudezas.
Xiangzi, cujo apelido é camelo, trabalha como puxador de riquixá nas ruas de Beijing. Jovem e ligeiro, não é de muito papo, mas tem muito orgulho de ser dono do próprio riquixá, algo raro, já que a maioria dos puxadores aluga um para poder exercer o ofício.
O passado estava se tornando um pesadelo que lhe roubava a fé no futuro. Às vezes, quase sentia inveja dos outros, que ao menos fumavam, bebiam e andavam sempre atrás de um rabo de saia.
Mas a felicidade de ser dono do próprio nariz, somado a ganância, o fazem aceitar uma corrida que lhe custaria muito caro, e a partir dali o leitor iria conhecer o destino de um jovem teimoso, sem educação formal, pouco aberto a conselhos, que irá mostrar as diferentes situações da população mais pobre na China de 1920.
A escrita de Lao She
O autor chinês nascido na cidade de Pequim Lao She opta pela narrativa em terceira pessoa para contar toda a trajetória do seu personagem Xiangzi em uma China que enfrenta não só desafios políticos, como sociais também.
Ao ambientar entre a classe mais simples, oferece ao leitor uma oportunidade de acompanhar de perto os efeitos que uma economia desigual entre os que não conseguem mudar os seus rumos, que vão do excesso de trabalho até a dificuldade de ter acesso a atendimento médico.
A ideia parecia-lhe insuportável, mas era provável que ainda fosse o desfecho da história. Restava-lhe seguir em frente e se preparar para o pior.
Aspecto também possível de ser identificada na própria ´forma narrativa, já que durante boa parte da história o escritor tem a tendência de detalhar as cenas ao extremo, e se inicialmente ele nos faz percorrer as ruas e habitar cada um dos locais citados, com o tempo, conforme o estilo do leitor, isto pode se tornar entediante.
E o desequilíbrio entra em um ponto identificado pelo próprio Lao She, que diz ter finalizado de forma abrupta. E eu concordo, pois na etapa final ele deixa de detalhar e passa correr para finaliza-la.
O inverno era um longo inferno para eles, e nem um fantasma precisava trabalhar tão pesado por tão pouco. A única esperança era caírem mortos na estrada, como cães.
O motivo é explicado por ele também: inicialmente O garoto do riquixá começou a ser publicado em uma revista chamada Yuzhoufeng, e deveria ter exatamente 24 capítulos. Motivo pelo qual os 3 capítulos extras para um melhor término não foram escritos.
O que eu achei de O garoto do riquixá
Começo utilizando um termo bastante popular para definir a obra: desgraça pouca é bobagem na vida do personagem principal da história, já que a impressão que eu tinha é que para cada acerto ele descia duas lombas, não conseguindo retornar ao ponto inicial nunca.
Absolutamente nada dá certo para Xiangzi, embora me obrigue a dizer, algumas situações poderiam ter sido evitadas se ele não fosse tão fechado a conselhos de pessoas próximas e observasse mais o mundo ao seu redor.
Não se atrevia a importunar ninguém, cedia passagem até para um cachorro. E, ao final, ali estava, ultrajado e sem ter a quem recorrer.
Pois apesar de trabalhar enlouquecidamente e ser extremamente econômico, como ocorre com boa parte da população até os dias de hoje, falta abrir a mente para a educação financeira.
E curiosamente ao mesmo tempo que Xiangzi se fecha para os conselhos financeiros, ele é facilmente manipulável por quem ele acredita ser superior ou admirável. Então ele trabalha muito, junta um bom dinheiro, mas não sabe como multiplica-lo para atingir os seus objetivos.
Ele havia sido injustiçado quando trabalhava de forma diligente, e agora tinha consciência de quão valiosa era cada gota de seu suor, por isso poupava cada gota.
Fazendo com que o personagem passe por inúmeras mudanças, mas não evolua, ele segue centrado no próprio umbigo e não aprende nada com o que dá de errado, nunca melhorando de vida.
Em contrapartida, as mulheres em suas participações secundárias mostram noções de gerenciamento de dinheiro e administração de negócio, só que sem valorização nenhuma disso, ficando a sombra do machismo típico do período retratado.
Quando tinham sorte, logo arranjavam uma ou duas moedas de prata, caso contrário não conseguiam nem ao menos o dinheiro para pagar o aluguel do veículo.
Aliás, adorei as personagens Tigresa e Ama Gao, suas passagens estão entre as que mais despertaram a minha atenção, principalmente por conseguirem viver e pensar de forma diferente, apesar do meio em que estão inseridas.
No geral achei o livro bacana pelo conhecimento de outra cultura, onde se consegue observar diferenças e semelhanças. Sobre a questão de ser uma crítica ao capitalismo, para mim a obra parece narrar mais os impactos de escolhas não pensadas, ganância, orgulho, teimosia e machismo. Mas esse é o meu olhar.
Ficando a dica para quem busca leituras de locais e épocas diferentes, gosta de uma pitada de história em meio a ficção e claro, para quem não resiste a um livro.
O garoto do riquixá
Luòtuó Xiángzi
Lao She
Tradução: Márcia Schmaltz
TAG - Estação Liberdade
2024 - 288 páginas
Publicado originalmente em 1936
Nenhum comentário:
Postar um comentário