domingo, 28 de fevereiro de 2010

Eu vivi por um sonho

Foi lendo O mundo de Sofia (livro já comentado nesse blog) que me deparei pela primeira vê com o nome de Olympe De Gouges, a autora da declaração dos direitos da mulher e da cidadã. Meses mais tarde, encontrei Eu vivi por um sonho, livro que narrava os últimos dias dessa francesa e a curiosidade foi imediata.

Maria Rosa Cutrufelli utiliza diversas narradoras (de idades, profissões, status social diferentes) para contar a história de uma mulher que ousou escrever o que pensava no governo de Robespierre e teve como destino à guilhotina.

Só que mais do que a história de De Gouges, o livro narra com força e sensibilidade a eterna luta das mulheres para terem o seu lugar no mundo. Enfrentando a raiva dos homens, a inveja e ignorância das próprias mulheres, De Gouges dá uma bofetada em suas leitoras ao dizer que nunca alcançaremos a igualdade enquanto não aplaudirmos a nós mesmas.

Eu vivi por um sonho é um livro apaixonante, histórico, onde o uso de adjetivos não deve ser poupado. Leitura obrigatória para o público feminino, além da chance de pensarmos se honramos mulheres como Olympe nos dias de hoje.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Memórias de Adriano


Sinopse: Já velho, o imperador Adriano escreve uma longa carta ao jovem Marco Aurélio, na qual recorda sob uma aura de melancolia e profunda perturbação os fatos de sua própria vida pública e privada, questionando-se sobre seu sentido e destino. Dono do mundo, mas consciente da transitoriedade das coisas humanas, Adriano pergunta a si mesmo quais as condições do ser - tão trágico, por não poder evitar a morte e a ruína, quanto extraordinário e proeminente o acaso quis que fosse. Também a paixão e o amor, que ao menos uma vez haviam iluminado sua existência graças ao encontro com o jovem grego Antínoo, transformam-se logo em luto devido ao silencioso suicídio do amado. E a Adriano não resta senão continuar vivendo para cumprir seu altíssimo dever, contemplando com angústia o "rosto disforme" das coisas.

Com o avançar da idade o imperador Adriano decide escrever suas memórias ao jovem Marco Aurélio em uma carta que se divide em seis partes. 

O que inicia com a descrição de uma consulta médica e os exames desagradáveis que se seguiram, logo ganham a companhia de histórias familiares, sua escalada até se tornar imperador, as grandes lutas por território, nomeações de pessoas para ficarem ao seu lado, as grandes paixões e naturalmente as perdas que o imperador viveu.

O olho clínico não via em mim senão um amontoado de humores, tristes amálgama de linfa e sangue;

O destinatário não é uma escolha aleatória, pois ele não irá receber apenas uma carta, todas essas memórias são de certa forma um treinamento teórico para Marco Aurélio, que seria nomeado seu filho, para herdar o seu imperio.

Memórias de Adriano é uma ficção biográfica que mistura fatos históricos, filosofia e amor à arte, publicado em 1951, essa releitura se tornou uma das obras-primas da literatura francesa contemporânea.

Era o homem da tribo, a encarnação de um mundo sagrado e quase terrível, de que encontrei, por vezes, vestígios junto aos necromantes etruscos.

Marguerite Yourcenar, que no período da publicação utilizou o pseudônimo de Marguerite Crayencour, escreve em seu romance os anseios, opiniões e divagações de um homem poderoso, mas já velho, que se prepara para a morte e, após iniciar a procura por um herdeiro, encontra em um jovem, a quem conhece desde menino, um de seus sucessores. 

Por ser uma carta, a narrativa ocorre toda em primeira pessoa, o que torna os momentos humanos de Adriano mais próximos do leitor, como o seu choro por perder uma paixão que só se torna inesquecível porque o rapaz procurou a morte, tornando um relacionamento fadado à acabar em eterno. 

Meu primeiro consulado foi ainda um ano de campanha, uma luta secreta, mas contínua, em favor da paz.

Entre as passagens que trazem a realidade mais forte na sua mistura com a ficção estão os desafios nas obras construídas em Jerusalém e os conflitos (tão antigos) que afetam a região. 

De bônus, a autora conta os eventos e notas que resultaram no livro, assim como a bibliografia utilizada, sendo um complemento para quem deseja se aprofundar na leitura.

Se nada disse ainda sobre beleza tão definitiva, não se deve ver nessa omissão a espécie de reticência do homem irremediavelmente conquistado.

Um livro que pode agradar principalmente os fãs de clássicos e fatos históricos, e podendo fascinar os que ainda não se preocupam com a passagem dos anos, suas limitações e muito menos a morte.

Memórias de Adriano
Memoires d'Hadrien
Marguerite Yourcenar
Tradução: Martha Calderaro
RBS Publicações
1951 - 286 páginas