O leitor embarca com o narrador nessa busca frenética, vinte anos depois do desaparecimento da cantora, que vira uma fixação para o protagonista, revelando-se uma procura por ele mesmo, mais do que isso, confunde-se com a do próprio autor.
A narrativa começa demonstrando a apatia do personagem principal perante a vida, mesmo tendo conseguido um emprego como jornalista, que poderia tirá-lo do marasmo e da falta de dinheiro. No decorrer da trama, entende-se a razão daquele torpor: uma paixão intensa por outro homem, Pedro, que apareceu e desapareceu de sua vida misteriosamente, deixando-o desnorteado, tira-lhe o prazer e o gosto de viver.
O homossexualismo, caracterizado em muitos contos de Caio Fernando Abreu, transpassa toda a obra, bem como o medo da AIDS, que aterroriza o jornalista e a roqueira Márcia, que não têm coragem de procurar um médico quando caroços sintomáticas da doença começam a aparecer no pescoço e outras partes do corpo.
A dúvida em saber se seriam ou não soro positivo atormenta os personagens e faz pensar se não seria reflexo do mesmo tormento que assolava o autor e que ele deixa transparecer no romance. Há, ainda, o fantasma de Igor, namorado da roqueira Márcia, que teria morrido de AIDS, retratando a realidade difícil da perda de pessoas, na época, vítimas da enfermidade, quando ainda não se sabia direito o que era essa doença.
O romance foi escrito entre 1985 e 1990. Daí explica-se o tema da ditadura, também recorrente, pois ainda presentes seus efeitos, remetendo os leitores a um período em que as pessoas desapareciam por questões políticas, dando a entender que Dulce Veiga teria sumido por se envolver com pessoas ligadas a assuntos contrários aos interesses de quem estava no poder na época.
Outras questões também são tratadas pelo autor, como a violência urbana, as drogas, o desencanto com o movimento das “diretas já”, que não atingiu seu objetivo.
Embora haja uma seqüência cronológica - cada capítulo tem o nome de um dia da semana –, há vários flashbacks, pois o narrador lembra de vários fatos do passado, dele com Pedro e de quando teria entrevistado Dulce Veiga.
Não deixa de ser um tempo psicológico, pois o romance em muitos momentos é intimista, há o pensamento do personagem, e esse não é linear, não corre de acordo com andamento cronológico dos fatos.
O narrador está completamente confuso e perdido na vida, e, por isso deixa transparecer várias ambigüidades: mostra-se inseguro para lidar com seu homossexualismo ou heterossexualismo (não sabe se gosta de homem ou mulher); a busca por Dulce Veiga se confunde com a própria busca por si mesmo.
Há uma tentativa do personagem desesperada de se encontrar e por isso ele começa a enxergar Dulce Veiga em vários locais, como uma alucinação, que ele segue como um louco, numa alusão à perseguição da compreensão que ele visa a atingir sobre o seu eu.
Ao final, o encontro com Dulce Veiga revela um eu egoísta, que abandona tudo para buscar a si mesmo. No caso, Dulce Veiga deixou de lado a filha pequena, o marido, os amigos, a própria carreira, como se, para encontrar a si mesma, fosse necessário renunciar a todo o resto. As pessoas sofrem sua ausência - principalmente a filha Márcia, mas também os fãs e o amante Saul, que enlouquece – porém ela parece não se importar, porque ela própria está feliz, em um lugar distante, e isso lhe basta.
As semelhanças com a vida do autor não são por acaso, visto que ele vivia uma situação de conflito, pela descoberta da AIDS e toda a angústia e sofrimento pela incerteza e percepção da efemeridade da vida que isso acarreta. Talvez o desaparecimento de Dulce Veiga significasse o seu próprio desaparecimento precoce em virtude da AIDS, onde deixaria tudo e todos para trás, porém com a recompensa (ou esperança?) de ir para um lugar melhor, onde dor e medo não existiriam, apenas a felicidade alcançada pela compreensão do significado da própria existência.