quinta-feira, 30 de abril de 2020

A filha secreta



Sinopse: A história de três mulheres e duas culturas: Kavita, uma camponesa indiana forçada a dar sua filha para adoção; Somer, a médica americana que não pode ter filhos e se torna mãe adotiva da menina; e Asha, a criança adotada que, quando adulta, parte para a Índia em busca da sua identidade. A filha secreta é uma história emocionante sobre amor e família em diferentes culturas, e sobre o quanto nossas origens são capazes de definir quem somos.

Foi nos balaios de ofertas da feira do livro de Porto Alegre que o encontrei, dei uma lida no resumo da orelha da capa e o trouxe para casa. Cinco meses depois me entreguei a delicada e ao mesmo tempo forte escrita da autora Shilpi Somaya Gowda em um tipo de história que toca o coração.

A filha secreta nos conta a história de três mulheres durante os anos de 1984 e 2009. Os dois primeiros capítulos são de perdas. Na Índia Kavita vê a sua primeira bebê ser arrancada dos seus braços simplesmente por ter nascido com o sexo errado em uma família pobre. Nos Estados Unidos, Somer vive mais um aborto. A alma de ambas chora.

Como tantas menininhas, a sua primogênita seria devolvida à terra muito antes da hora devida.

Kavita engravida novamente, Somer descobre que apesar de jovem em breve irá entrar na menopausa. E sem saber, neste momento o caminho das duas começam a se entrelaçar. O segundo bebê de Kavita é outra menina, e na ânsia de salva-la, ela se arrisca indo até Mumbai, e com a ajuda da irmã, entrega a sua filha Usha para adoção.

O meu útero está ótimo e vazio de novo. Limpo.

Sem chance de ter filhos naturais, Somer acaba aceitando a sugestão de seu marido indiano de adotar uma criança. Sua sogra auxilia um orfanato, e assim, ela é convencida a adotar uma criança indiana. Usha agora é Asha, e o seu futuro está longe da terra natal.

Como se pode comer uma coisa sem cor nem sabor?

Narrado em terceira pessoa, a história é dividida em quatro partes. Os capítulos sempre identificam em que personagem está o foco, a cidade, o país e o ano.

Somer olha a filha que em nada parece sua filha.

Inicialmente acompanhamos Kavita e Somer, suas dores e escolhas, cada uma realizando uma espécie de gestação, sendo uma literal e a outra de uma ideia. Com o crescimento de Asha, acompanhamos os seus dilemas, o desejo de conhecer a família de origem e seus conflitos. Para esta jovem mulher é necessário viver a Índia para entender o seu próprio destino.

Ele os levara para lá e cuidaria deles.

Complementando a história, eventualmente a narrativa dos maridos de Kavita e Somer e da sogra de Somer, ampliando as situações vivenciadas pelas personagens.

Você precisa confiar nele. Você precisa ser corajosa por eles.

O livro possui três temas de base: a questão da maternidade, a adoção e diferenças culturais. Na maternidade temos as dores, orgulho e superficialmente o não querer. Na adoção temos as incertezas, a busca por um apoio desconhecido em momentos de dúvida, como se os pontos de interrogação tão comuns durante a infância e adolescência ganhassem um tamanho maior por não compartilharem o mesmo sangue. E cultural por termos dois estilos de vida completamente diferentes quando em conflito, podendo virar uma barreira ainda maior quando não conseguimos entender o outro. 

Não sei de quem puxei os meus olhos exóticos, tem vontade de gritar.

Um ponto que não digo negativo, mas que eu senti falta, foi que com a inclusão da narrativa de Asha, perdeu-se muito da Somer. Muitas coisas mudam na vida dela com a chegada da filha, e esses desafios não são bem explorados. No futuro sabemos que ela, como muitas mães, precisou fazer escolhas. Sabemos também que nem sempre Asha se sente compreendida por Somer, buscando muito mais o pai, mas não existe o início destes conflitos, quando aparecem já possuem uma carga de anos.

Mesmo assim achei a história muito interessante e bonita. A narrativa é fluída e envolvente, e me senti muito próxima das personagens femininas, acompanhando as mudanças, algumas sutis outras nem tanto, no decorrer do tempo. Uma leitura que recomendo.

A Filha Secreta
Shilpi Somaya Gowda
Tradução Maria Beatriz de Medina
Editora Record
2010 – 380 páginas

sexta-feira, 17 de abril de 2020

Um homem bom é difícil de encontrar e outras histórias



Sinopse: Uma escritora franzina, doente, cujo hobby era a criação de... pavões, vivendo em uma isolada cidadezinha norte-americana. Definitivamente, não parece ser a descrição de alguém que se tornaria uma das autoras mais influentes de nosso tempo. No entanto, foi assim que Flannery O’Connor, falecida precocemente em 1964, conquistou um lugar único no cânone literário do Ocidente. Sobretudo por meio de seus contos, essa jovem católica conseguiu criar um universo sem igual, em que a realidade decadente do Sul dos Estados Unidos se mescla a personagens grotescos, responsáveis por desnudarem a redenção e a perdição de figuras que, se julgadas pelas aparências, confundiriam nosso juízo e revelariam nossos preconceitos.

Um homem bom é difícil de encontrar e outras histórias foi o livro enviado pela TAG Curadoria no mês de março, indicado pela escritora Martha Batalha. Com um bonito projeto gráfico, o livro contém 10 contos da escritora norte-americana Flannery O’Connor, um prefácio da doutora em literaturas africanas Aza Njeri e uma apresentação do tradutor Leonardo Fróes.

E aqui encontramos o primeiro problema do livro: o prefácio deveria ser um posfácio e a apresentação deveria ser um fechamento, esta última principalmente pelos spoilers que contém, revelando inclusive o final de um dos contos.

O interessante deste livro em época de opiniões extremas é que ele consegue se aderir aos dois lados, já que ele é facilmente adaptável a qualquer uma das visões, seja pelo uso constante de comentários racistas, seja pela grande quantidade de referências religiosas. E para quem gosta de encontrar simbologias, os contos podem ser uma verdadeira diversão.

Os contos do livro:

Um homem bom é difícil de encontrar: aqui temos uma avó que mora com o filho, nora e netos. Após ver a notícia de um criminoso que fugiu de uma penitenciaria ela tenta convencer o filho a mudar o destino. Sem sucesso, ela embarca junto e memórias e opiniões vão sendo reveladas conforme a paisagem passa pela janela.

Qualquer um que a visse morta na estrada, em caso de acidente, logo saberia tratar-se de uma senhora distinta.

O rio: um pai paga para que uma mulher cuide de seu filho com cerca de quatro ou cinco anos e ela leva a criança até uma sessão de cura no rio, o que irá impressionar o menino.

Existe apenas um rio, que é o Rio da Vida, e ele é feito do Sangue de Jesus.

A vida que você salva pode ser a sua: em uma casa próxima a estrada vive uma senhora e sua filha surda, um dia chega um homem que se encanta pelo carro estacionado na garagem, e trocando trabalho por hospedagem e comida, vai ganhando a confiança da dona da casa.

Madame, eu daria uma fortuna para viver num lugar onde eu pudesse, toda tarde, ver o sol fazer isso.

Um golpe de sorte: através de Ruby vamos desvendando página a página os seus dramas familiares enquanto ela sobe os degraus de um edifício para chegar até o seu apartamento. Durante o caminho, encontros com os vizinhos garantem os diálogos e informações adicionais.

Que horror, deixar um marido como aquele ver que se tinha um irmão assim.

Um templo do Espírito Santo: a visita das primas adolescentes mais velhas despertam a curiosidade em uma menina de 12 anos que ainda não pode acompanha-las durante o final de semana, e passa observando e tentando captar as suas informações.

Foi assim que ele me quis e eu não discuto com ele.

O negro artificial: um avô cria o seu neto órfão, e ao mentir que o menino havia nascido em Atlanta desperta a curiosidade da criança. E com o objetivo de mostrar que a cidade não é tão legal quanto o neto imagina, eles vão passar um dia por lá. 

Uma criança de seis meses não sabe que diferença existe entre um negro e os outros.

Um círculo no fogo: em uma fazenda vive uma mulher com sua filha pré-adolescente e seus criados. Um dia o filho de um ex-trabalhador retorna acompanhado de amigos após a morte do pai, com a justificativa de mostrar o lugar onde possui as melhores lembranças de sua vida.

Tentei ser boa com vocês, tratei-os com gentileza, não foi?

Um último encontro com o inimigo: Sally irá se formar aos 62 anos, e todas as noites ela reza para que o avô, um militar de 104 anos, esteja vivo para participar da cerimônia da colação de grau.

Viver passara a ser um tal hábito para ele que lhe era impossível conceber outro estado.

Gente boa da roça: outra vez a dupla mãe e filha morando na fazenda, aqui a filha é adulta e Ph.D., e o gatilho da história ocorre com a chegada de um vendedor de bíblias. É a história mais bizarra e engraçada do livro.

A mais importante de suas frases era contudo esta: cada um tem o seu modo de ver.

O Refugiado de Guerra: uma viúva dona de uma fazenda aceita receber uma família de refugiado da Polônia. O homem, hábil com máquinas e muito trabalhador, provoca um desiquilíbrio nas relações e reações dos outros empregados e na própria patroa.

Branco ou preto, hoje em dia ninguém pode arranjar lugar facilmente.

Conforme a minha leitura foi avançando, eu me lembrei do que um escritor/poeta me disse uma vez em uma aula de crônica: quando você deixa as suas opiniões tomarem conta da história, ela é sufocada e se perde. Na época a minha primeira pergunta foi como assim o personagem não pode ser um reflexo das minhas ideias? 

Só consegui ter um entendimento claro daquela afirmação ao ler o livro de contos de Flannery O’Connor. Mesmo sendo uma apaixonada por contos, a vontade de abandonar a leitura foi o sentimento predominante, e um dia eu aprendendo a fazer isso, e o fato é que eu literaturei este livro.

Os contos de O’Connor no geral são terrivelmente previsíveis, como um juiz absoluto, a questão religiosa está em todos os contos, só faltando aparecer o He-Man no final dizendo a lição que aprendemos naquele episódio (agora eu entreguei a idade, não?!). 

Os personagens são muitos semelhantes, a tal ponto que muitas vezes parece que já lemos aquela história, só que com troca de nome dos que serão julgados e sofrerão algum castigo ou redenção divina no final. Faltando aquele lado surpreendente característicos dos contos, que te deixam sem fôlego ou reflexivo. 

O que é bastante curioso, já que seus contos possuem uma alta carga de violência, seja física ou psicológica. Eles também possuem uma grande carga social, onde entra a questão do lugar da mulher, negros, imigrantes, relações familiares e as diferenças financeiras. Fornecendo todo um contexto de um período na região Sul dos Estados Unidos.

E aqui entra a frase do meu professor, ao deixar que a sua forte religiosidade interferisse na escrita, ela se perde justamente no que considero a parte fundamental do conto: o seu encerramento.

Mas como livro é uma questão de gosto, e a autora é considerada uma referência, fica a indicação, vai que você goste? Só não vale xingar nos comentários por discordar da opinião.

Um homem bom é difícil de encontrar e outras histórias
A Good Man is hard to find and Other Stories
Flannery O’Connor
Tradução: Leonardo Fróes
TAG – Editora Nova Fronteira
1953 – 287 páginas

terça-feira, 7 de abril de 2020

Frankenstein



Sinopse: Eu era dotado de uma aparência horrorosamente deformada e repugnante, não possuía sequer a mesma natureza dos homens. Quando olhava ao redor, não via e nem ouvia falar de alguém como eu. Então, será que eu era um monstro, uma nódoa sobre a Terra, alguma coisa da qual todos os homens fugiam e a quem todos repudiavam? Não posso descrever a agonia que essas reflexões infligiram à minha pessoa.

Foi devido a uma brincadeira entre amigos sobre quem escrevia a melhor história de terror que Mary Shelley teve a ideia para o seu Frankenstein, publicado anos depois, se tornou um clássico da literatura.

Eu já havia ouvido falar no livro, mas a imagem que eu tinha era a repassada pelo cinema, embora admita que só tenha visto o personagem em animações consideradas infantis.

Às vezes, meu temperamento era agressivo e minhas paixões, calorosas.

Então qual não foi a minha surpresa ao descobrir que Frankenstein era o nome do criador, e não da criatura? E sim, mesmo sendo tão conhecido, a leitura do livro pode dar uma nova visão do leitor sobre a história.

Quem nos conta esta história é o jovem Walton, que tem a curiosidade de chegar em uma área até então nunca visitada (estamos em 17... sim, o ano certinho é desconhecido), e para chegar aos polos e desvendar os seus mistérios, ele embarca junto com a suta tripulação em um navio para realizar o seu sonho.

Os mestres antigos dessa ciência prometeram coisas impossíveis e nada realizaram.

Durante a sua expedição, ele irá recolher junto ao gelo um homem chamado Victor Frankenstein, adoentado, ele leva alguns dias para contar a sua história a quem lhe salvou e de quebra ao leitor.

Assim como Walton, o jovem Frankenstein possuía um sonho, e é durante a faculdade que ele coloca a sua curiosidade sobre filosofia e ciências naturais em prática. Seu projeto tinha como objetivo responder uma pergunta nada fácil: qual o princípio da vida?

Assim terminou aquele dia memorável, que decidiu o meu destino futuro.

Obcecado em descobrir a resposta, durante muitos meses ele se afasta da família, se dedicando a sua criação. Mas quando a sua criatura abre os olhos, ele é tomado de nojo e decepção com o monstro que criou. E assim o abandona, deixando a criatura sem nada e perdida no mundo.

Sozinha, a criatura tenta entender o seu lugar no mundo, mas encontra apenas a decepção, pois a recepção das pessoas fica muito longe de ser amigável, já que a sua estatura elevada e suas feições facilmente despertam o medo em quem o vê. O incrível é que ele é um ser muito inteligente, com capacidade de aprendizagem, além da sua grande velocidade e força física, tornando-o ao mesmo tempo único e monstruoso.

Para examinar as causas da vida, devemos primeiro recorrer à morte.

Uma outra curiosidade é que apesar do fato de Frankenstein ser uma espécie de cientista, ele referencia o destino inúmeras vezes, como se ele fosse uma marionete cujas escolhas não iriam interferir no destino final. 

Frankenstein possui três narrados, as cartas do jovem Walton para a irmã que mora em Londres, e em primeira pessoa pelo criador e criatura. O que nos permite ter uma visão interna do que ocorre com os dois personagens principais e a visão de um terceiro, que é quem transcreve a história.

Eu gostei da história, mas confesso que em nenhum momento pulei da cadeira ou senti arrepios durante a leitura, me parecendo mais uma história sobre a psicologia e relacionamentos, escolhas e consequências, tanto do criador quanto de sua criatura. O que em muitos momentos me fez ter pena dos dois.

Frankenstein
Mary Shelley
Tradução Silvio Antunha
Editora Principis
1818 - 240 páginas

segunda-feira, 6 de abril de 2020

Stalker



Sinopse: Deprimida após sofrer um abordo espontâneo, Fig Coxbury passa seu tempo em praças observando as crianças que poderiam ser a sua filha. Até que uma menininha brincando com a mãe desperta uma obsessão. Logo, Fig se vê mudando de casa e de bairro não por necessidade, mas porque a casa vizinha oferece tudo o que ela deseja: a filha, o marido e a vida que pertence a outra pessoa.

Em um livro que está mais para o comportamento humano do que um trailer de suspense, Tarryn Fisher disponibiliza em seu Stalker três narradores: Fig, Darius e Jolene. Como um quebra-cabeça, cada um fornece as suas informações, algumas em comum, outras novas e claro, as que se contradizem.

O capítulo de Fig já informa ao leitor, ela é uma psicopata. Manipuladora, ela busca a atenção dos personagens do livro e do leitor, ao qual muitas de suas frases divertem. Muitas vezes pensei nela como a esposa perfeita para o Adam de Estação Atocha.

Gente muito inteligente pensa o tempo todo, a cabeça está sempre tomada por pensamentos brilhantes.

A história começa em uma praça, onde ela vê uma menina pequena com cabelos loiros esvoaçantes. Ela se sente acordar de um longo sono, associando a garotinha a criança perdida ainda nos primeiros meses de gravidez. Com isso ela segue mãe e filha e descobre onde elas moram, passando a observa-las.

Sua terapeuta logo identifica a sua obsessão, mas naturalmente ela não ouve os conselhos e opta em comprar a casa ao lado da mãe, que oportunamente está à venda. Logo ela conquista a amizade da mãe desnaturada, apelido carinhoso que ela dá Jolene em pensamento. Neste momento a menina se torna secundária, pois o que ela tenta na realidade é se tornar igual a mãe, desde a forma de postar no Instagram até a forma de se vestir.

Três coisas atraem a atenção e o olhar sedento das mulheres em um grupo: bebida alcóolicas, homens e fofocas.

Curiosamente a personalidade de Fig se ajusta a cada pessoa que ela encontra, para atrair a atenção da mesma. E isto ocorre conforme ela se envolve com Darius, o marido de Jolene. Assim como a menina, ele faz parte do pacote dos itens que ela deseja se apropriar.

A narrativa da personagem Fig é a maior do livro, sendo compostas por capítulos curtos, cada um identificado por um título, estes dão uma ideia do que irá por vir, e por isso exigem um cuidado maior para quem gosta de ler em espaços públicos. Digo isso pelo fato de em determinada página ter capítulos em letras garrafais nomeados como A xoxota mais bonita, por exemplo.

A sociedade nos treinou para acreditar que elas têm segundas intenções.

Para não estragar a surpresa, não irei detalhar muito os próximos capítulos, mas alguns detalhes são impossíveis de não escapar, então se você curte a surpresa pura, pule os próximos dois parágrafos.

O capítulo de Darius já inicia com uma característica utilizada por Jolene para classifica-lo: o sociopata – neste momento eu pensei que carma o dessa mulher. Ele é um psicólogo muito apaixonado pela esposa, mas que não resiste a outras mulheres. Manipulador como Fig, ele tem a vantagem de realizar uma leitura prévia das situações, muitas vezes questionando o bom coração de Jolene. Aqui temos novas peças sobre Fig, revelando situações que ela habilmente não nos conta, a fim de manter a nossa simpatia por ela.

Ela era como o bêbado contente que a gente encontra em uma boate.

Quem encerra a narrativa é a vítima dos dois malucos da história. Utilizando a sua profissão para a parte três, conhecemos a história de Jolene, e que ela não é tão boba como os outros dois pensam. Como qualquer ser humano ela tem os seus defeitos e qualidades, e precisa se cuidar para não ser levada a loucura pelos outros. E por isso o leitor pode se sentir muito próximo dela.

Ela é uma escuridão caótica disfarçada de luz.

Stalker é um vira página, a narrativa é fácil, e embora alguns capítulos da Fig sejam mais arrastados, as vezes meio repetitivos, a leitura é bastante rápida. E apesar do assunto aparentemente pesado, ele tem um lado mais cômico, o que torna a leitura muito louca e divertida. O tipo de livro perfeito para relaxar de leituras mais tensas.

Stalker 
Tarryn Fisher
Tradução Elenice Barbosa de Araújo
TAG – Faro Editorial
2015 – 287 páginas

quinta-feira, 2 de abril de 2020

Foi Apenas um Sonho



Sinopse: Foi Apenas um Sonho conta a história de Frank e April Wheeler, um casal talentoso e jovem que, ao se mudar para uma casa no subúrbio de Nova York, acredita ter toda a vida diante de si, e que o sucesso há de chegar a qualquer momento. Mas, à medida que os anos passam, eles vão mergulhando num mundo de intrigas e frustrações, e só uma grande guinada poderá alterar seu destino.

Publicado em 1961, Richard Yates conta a história de um jovem casal classe média americano. Ele trabalha na mesma empresa que o seu pai trabalhou, em um grande edifício na cidade de Nova York, ela é dona de casa e cuida dos dois filhos do casal em um típico bairro do subúrbio, onde para chegar a Big Apple é necessário pegar uma balsa.

De fora aparentam ser um casal perfeito vivendo uma rotina, mas dentro das paredes ocorrem explosões, são brigas que afetam até mesmo as crianças, que parecem acostumadas com a gritaria. Muitas destas discussões também possuem agressões físicas por parte de Frank, o que me despertou forte antipatia.

Nos bastidores, amontoados e na escuta, os demais integrantes da trupe sentiram por ela um amor súbito.

Aos poucos os leitores são apresentados as rachaduras deste casamento, cujo relacionamento foi totalmente transformado com a primeira gravidez. Frank que parecia ter um grande potencial, vive o marasmo do dia-a-dia fazendo de conta que trabalha e flertando com a colega de trabalho.

Mas se Frank já se habituou ao marasmo, April parece sentir o copo encher após participar de uma peça de teatro, onde inicialmente brilhava, mas foi perdendo a força após cada ato e troca de diálogos desencontrados. O resultado disso foi uma briga recheada de ofensas e uma ideia de April: se mudarem para a Europa.

Ela não fugiria dele agora, e não havia a menor chance de ele voltar a explodir de raiva; estavam os dois exaustos.

Só que para um plano se realizar é necessário manter segredo sobre ele, e ao tornar público a roda do destino volta a girar, levando April e o leitor a situações limites.

Narrado em terceira pessoa, a história é dividida em três partes, e nos situa no ano de 1955, onde todos possuem segredos sob sua aparência, como é possível ver nos breves relatos do casal de amigos e da corretora de imóveis que mora na vizinhança. Sua narrativa é clara, e o seu desfecho vai sendo construído ao longo de cada parte, quando as facetas, junto com o passado do casal principal vão pouco a pouco sendo desvendadas.

Era o seu suplício diário, iluminado, seco, a sua cota particular de tédio.

O papel da mulher ainda é secundário, embora elas mantenham a ordem e muitas vezes definam caminhos. As relações um tanto superficiais, deixam claro que April não tem com quem realizar troca de confidências, sua confiança era limitada a deixar os filhos na casa do único casal de amigos que ela tinha.

Em relação a Frank, não consegui ganhar simpatia por ele, a sua malandragem canalha incomoda, mostrando um homem extremamente insensível, egoísta e narcisista. Nem mesmo suas lembranças e potencial conseguiram me fazer ter empatia por este personagem, por mais perdido que ele fosse na realidade.

Mas, depois da interrupção, a voz de April não voltou a lhe falar.

Uma história sobre relações, comodismo, orgulho, chantagem emocional, desespero e esperança. Cujo ritmo é como um trem, que começa devagar e vai ganhando intensidade conforme a história nos abre novas portas. E é isso que faz a história interessante e faz valer a pena a leitura.

Existe uma versão cinematográfica com a Kate Winslet e o Leonardo DiCaprio no papel de April e Frank, não assisti ainda, mas fiquei curiosa para saber como a história foi transportada para a tela.


Foi apenas um Sonho (Rua da Revolução)
Revolution Road
Richard Yates
Tradução: José Roberto O’Shea
Editora Alfaguara
1961 - 306