sábado, 29 de dezembro de 2018

Hoje eu venci o câncer



Sinopse: O jornalista, romancista e cronista David Coimbra se dedica aqui a provar que o otimismo e a vontade de viver podem ser uma prescrição eficiente no conjunto de medicamentos com que se enfrenta uma doença grave. Em primeiro lugar, não se deve nunca abdicar do direito de (con)viver com seus afetos e se dedicar aos bons amigos e à família; depois, é valorizar o dia a dia naquilo que ele tem de mais trivial, seja um nascer do sol ao lado do filho ou a singela aquarela de um poente tímido. Você pode estar em Porto Alegre, no Rio de Janeiro, em Dubai ou em Massachusetts, não importa. O essencial é viver o presente da melhor maneira possível, um dia após o outro, comemorando cada vitória.

Câncer é o nome dado a um conjunto de mais de 100 doenças que têm em comum o crescimento desordenado de células, que invadem tecidos e órgãos.

Dividindo-se rapidamente, estas células tendem a ser muito agressivas e incontroláveis, determinando a formação de tumores, que podem espalhar-se para outras regiões do corpo.

Os diferentes tipos de câncer correspondem aos vários tipos de células do corpo. Quando começam em tecidos epiteliais, como pele ou mucosas, são denominados carcinomas. Se o ponto de partida são os tecidos conjuntivos, como osso, músculo ou cartilagem, são chamados sarcomas.

Outras características que diferenciam os diversos tipos de câncer entre si são a velocidade de multiplicação das células e a capacidade de invadir tecidos e órgãos vizinhos ou distantes, conhecida como metástase.” Fonte: Inca 

Também conhecida como doença ruim, termo com o qual a própria avó do David chamava, o seu diagnóstico leva qualquer pessoa a nocaute. Durante muitos anos foi sinônimo de sentença de morte. Sua origem pode ser genética, pode ser por hábito, alteração do ambiente, local de trabalho ou apenas uma ironia do destino.

Quando descobri que ia morrer, decidi escrever esse livro.

O escritor e colunista David Coimbra conta a sua história em um livro rápido e envolvente, mas ao contrário do que o título possa induzir, não é sobre morte, mas sobre vida. Para quem o acompanha aqui no Sul do Brasil sabe que ele se mudou para Boston para ser cobaia em um tratamento que o faz vencer a cada dia esta doença tão temida. Mas ao contrário do que se possa imaginar, não é um livro que deixara o leitor depressivo, mas sim, reflexivo.

Originalmente o livro foi iniciado para o filho de David, Bernardo, na época com 5 anos, para que ele tivesse recordações do pai, visto que o câncer do escritor estava em um estágio bastante agressivo. O mesmo foi adaptado conforme os meses se transformaram em anos, e o que lemos é vida, família, amizade e lealdade.

Você não é necessariamente culpado pelas coisas ruins que lhe acontecem, nem necessariamente merecedor das boas.

O livro é uma mistura de várias etapas da sua vida e colunas escritas para o jornal Zero Hora em dias especialmente marcantes para ele. É curioso ver que no mesmo dia em que David descobriu a doença que estava instalada em seu corpo a cerca de 10 anos ele escreveu a espirituosa coluna O que o homem gosta na mulher, em que ele finaliza com frases de belas mulheres, sendo talvez a que mais combine com o autor a da atriz Sharon Stone “O humor é uma forma de ser valente”.

Naturalmente existem momentos tristes, ali está descrito a dor a cada cirurgia, as reações do pequeno Bernardo, o baque de descobrir outro amigo com câncer, lembranças de um pai que o abandonou. Mas tudo equilibrado com a força de uma mãe guerreira, da esposa Marcinha, e dos amigos. E os amigos rendem os capítulos mais divertidos, dando a leveza e a valentia necessária ao se falar de um tabu.

Um dia bem vivido, sem dores físicas importantes, em que você agiu com correção e que termina em paz é um dia plenamente feliz.

Há também a questão da adaptação nos Estados Unidos, que vai da língua aos itens do dia-a-dia, do que parecia breve e se tornou permanente. E como ele correu atrás para participar de um programa de pesquisa, indo de um médico a outro em uma corrida contra o tempo.

E talvez este seja o grande mérito, ao juntar nas mesmas páginas humor, ironia, tristeza, abandono, superação, dor e saudade, a vida realmente pulsa. Não houve conformismo, apenas vontade de viver e ser feliz. 

Atualização 27/05/2022: é com muita tristeza que incluo esta nota na resenha, para dizer que David Coimbra resolveu no dia de hoje contar as suas histórias em outro lugar. Fica a saudade para os seus leitores, que como eu, admiravam a sua inteligência, humor, ironia, força, suas dicas de filmes e séries, sua gentileza ao autografar um livro.

Hoje Eu Venci o Câncer
David Coimbra
L&PM
2018 – 204 páginas 

quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

Nada



Sinopse: Nada é um livro inesquecível. Escrito em 1944, quando a autora tinha apenas vinte e três anos, e vencedor da primeira edição do prêmio Nadal, é considerado uma das obras espanholas mais importantes do século XX. Segundo Mario Vargas Llosa, é um romance composto com maestria, e, para o New York Times, ainda hoje "o charme peculiar do livro continua inalterado". 

A cada nova viagem, seja física ou literária, mais tenho me encantado, ou melhor, me apaixonado pela história e cultura da Espanha, e com este livro, enviado em novembro de 2018 pela TAG Curadoria, não foi diferente.

Em Nada a autora Carmen Laforet, que escreveu este livro na juventude de seus 23 anos, me levou novamente para as ruas de Barcelona, agora após a guerra civil espanhola, o que me fez lembrar A Praça do Diamante da autora Mercê Rodoreda.

Era a primeira vez que viajava sozinha, mas não estava assustada; ao contrário, aquela profunda liberdade na noite me parecia uma aventura agradável e excitante.

Dividido em três partes, Nada conta a história de Andrea, uma moça de 18 anos órfã que sai da casa da família paterna para a casa da avó materna com o objetivo de estudar letras na Universidade de Barcelona.

Na primeira parte o leitor irá se deparar com a expectativa inicial, nas lembranças de Andrea uma casa limpa e estruturada, que logo é quebrada ao chegar no prédio da Rua Aribau.

Eu me sentia oprimida como sob um céu carregado de tempestade, mas pelo visto não era a única a sentir na garganta o gosto áspero da tensão nervosa.

O cenário é de empobrecimento, sua avó está fragilizada, o avô faleceu, sua tia Angustias a controla com mão de ferro e discursos moralistas, seu tio Juan e a esposa Gloria possuem um relacionamento doentio e um menino ao qual Andrea nunca diz o nome.

Um andar acima, como um marionetista vive o tio Román, um espião artista sedutor, que tem prazer em gerar confusões, assim como a sua empregada tem em assistir.

Segredo é para se guardar, não para sair espalhando por aí, muito menos para jogar um homem contra o outro.

A segunda parte é de descobertas, da liberdade de andar pelas ruas de uma Barcelona sombria, de amizades fugazes, da mistura de maturidade e inocência de uma menina-mulher cuidada e amada por ninguém.

O fechamento da história ocorre na terceira parte, que curiosamente é a que pode gerar maior estranhamento, visto que é possível detectar uma sutil mudança de escrita. Entre revelações que estão no limite da verossimilhança e uma morte misteriosa, a personagem encerra um ciclo em meio à loucura.

Recebia tapas nas costas, e eu, vermelha e tossindo até as lágrimas, não conseguia parar de rir; depois acabei chorando de verdade, angustiada, triste e vazia.

Escrito em 1944, durante o período da ditadura de Franco, o livro também possibilita uma interpretação política, onde os personagens representariam uma estrutura. Outra linha possível, que é bastante forte no texto, é em relação à própria guerra e seus efeitos. Como no momento em que Angustias justifica para Andrea o comportamento dos irmãos ao dizer que "depois da guerra, eles ficaram meio doentes dos nervos".

Outra vertente são as mulheres e seus papeis. Elas são várias na história, dos perfis tradicionais que abrem mão de suas vontades para atender a família, passando pela mãe católica que defende os filhos homens, até a jovem rica que testa o seu poder de sedução, chegando à esposa que apanha do marido por motivos gratuitos sem sair desta roda de violência e loucura.

Na verdade, eu pensava que ele realmente precisava de mim, que precisava mesmo conversar, como tinha dito.

Narrado em primeira pessoa, o aprofundamento só ocorre ao que interessa a Andrea, o leitor vive em mundos paralelos entre a fome da Rua Aribau e o luxo dos seus colegas de classe. Entre dores de cabeça e caminhadas, será possível passear pelo litoral, as apertadas ruas do bairro Gótico, a movimentação de La Rambla, enquanto tenta compreender o que é o nada.

Um livro intenso, aberto a interpretações que as experiências de vida do próprio leitor pode proporcionar. Um clássico de leitura rápida e inquietante.

Nada
Carmen Laforet
Tradução Rubia Prates Goldoni
TAG - Alfaguara
1945 - 279 páginas

Ficou interessado em assinar a TAG? Indique o meu código de amigo ANDJ8CMF e ganhe 30% de desconto na primeira caixinha.