quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

O livro do riso e do esquecimento




Fugindo um pouco do procedimento básico destes posts, de ler o livro, contar a síntese e apreciar, eu vou colocar aqui um trecho da obra "O livro do riso e do esquecimento", de Milan Kundera, que acabo de ler (o terceiro dele que já li, todos maravilhosos). 
"Aquele que escreve livros é tudo (um universo único para si mesmo e para todos os outros) ou nada. E porque nunca será dado a ninguém ser tudo, nós todos que escrevemos livros não somos nada. Somos desconhecidos, ciumentos, azedos, e desejamos a morte do outro. Nisso somos todos iguais: Banaka, Bibi, eu e Goethe. A irresistível proliferação da grafomania entre os políticos, os motoristas de táxi, as parturientes, os amantes, os assassinos, os ladrões, as prostitutas, os prefeitos, os médicos e os doentes me demonstra que todo homem sem exceção traz em si sua potencialidade de escritor, de modo que toda a espécie humana poderia com todo direito sair na rua e gritar: Somos todos escritores! Pois cada um de nós sofre com a idéia de desaparecer, sem ser ouvido e notado, num universo indiferente, e por isso quer, enquanto é tempo, transformar a si mesmo em seu próprio universo de palavras. Quando o dia (isso acontecerá logo) todo homem acordar escritor, terá chegado o tempo da surdez e da incompreensão universais." 

Que as palavras de Kundera falem por si, a todos nós. E, se puderem, não deixem de ler o livro.

domingo, 15 de fevereiro de 2009

O Outro Lado de Mim




Sinopse: Um dos maiores escritores de todos os tempos cunhou o famoso sobrenome ainda jovem, quando se candidatava a apresentador em um programa de calouros. Nos meados de 1930, os EUA atravessavam uma crise devastadora. Sidney, que observava o tempo passar atrás de um balcão de uma drogaria, sentia na pele os efeitos daquela atmosfera melancólica e depressiva. Sua família era obrigada a se mudar frequentemente, em busca de oportunidades de emprego. Para ele só havia uma saída. O suicídio. Uísque com soníferos. As memórias de um dos maiores escritores de todos os tempos. Detalhes até hoje inéditos, em um livro revelador e sincero. 

Sidney Sheldon é um dos autores mais traduzidos no mundo. Conhecido por títulos como “A ira dos anjos” e “Se houver amanhã”, teve como última publicação um livro de memórias com o sugestivo nome de O Outro Lado de Mim, uma clara referência ao seu primeiro romance de sucesso “O outro lado da meia-noite”. 

O outro lado de mim começa com um Sidney de dezessete anos planejando o seu suicídio. Diagnosticado como portador da psicose maníaco-depressivo, passou a vida inteira oscilando entre euforia e tristeza. Somado aos sucessos e desastres de seus textos, o próprio autor comparou sua vida a um elevador. Infelizmente, para por ai. 

Está superestimando o meu pequeno talento e vai se decepcionar. Não sou bom o bastante para trabalhar com ele.

Seu livro de memórias é superficial ao relatar os seus sentimentos, parecendo mais um resumo do dia-a-dia dos estúdios de Hollywood e das peças da Broadway, apimentados com comentários sobre a vida pessoal de alguns famosos (como Marilyn Monroe e Frank Sinatra). 

Sheldon compara suas duas carreiras, afirmando que um romancista é mais valorizado que um roteirista. Pois todos sabem os atores de um filme/seriado/novela, mas dificilmente lembrarão de quem o escreveu. 

Ia desistir de três espetáculos que contavam comigo, e partiria para muito longe, para enfrentar a morte.

Ler O outro lado de mim é ler as críticas recebidas por cada roteiro escrito por Sheldon, saber qual ator participou, quem estava começando, quem já era uma estrela, quem comandava o mundo do cinema, como se comportavam. Enfim, parte da memória do próprio cinema americano.  

Com base nisso, pode-se dizer que o livro de Sheldon nada mais é, que um tributo aos roteiristas, que esperam o telefone tocar, ganham dinheiro quando um roteiro faz sucesso e a carta de demissão quando a crítica é negativa. Mostrar quem nunca é visto por alguém que ainda será lembrado por muito tempo.

No que se refere à literatura, ficam as últimas páginas e o prazer que ela lhe proporcionou. Como o próprio Sidney Sheldon definiu O romancista é o elenco, o produtor e o diretor. O romancista é livre para criar mundos inteiros, para voltar no tempo, para dar a seus personagens exércitos, criados, mansões. O único limite é a imaginação.

De bônus, como não poderia faltar, fotos de momentos marcantes de sua história, misturando filmes, séries e momentos pessoais, assim como as memórias relatadas.

O outro lado de mim
The other side of me
Sidney Sheldon
Tradução: Ana Luiza Dantas Borges
Editora Record
2005 - 376 páginas

Livros do Sidney Sheldon resenhados no blog:
Nada dura para sempre

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

O Homem Comum




Philip Roth - premiado por diversas de suas obras como Pastoral Americana(1997), em que ganhou o Pulizer Prize, a National Medal of Arts(1998) e a mais alta premiação da American Academy of Arts and Letters, a Gold Medal for Fiction (2002); e Complô contra a América, que foi premiado como o melhor romance histórico de tema americano, pela Society of American Historians em 2005 - recebeu mais três premiações, desta vez por O Homem Comum: o PEN Nabokov Award (2006), o PEN Saul Below Award (2007) e o PEN Faulkner Award. 
Na obra, O HOMEM COMUM, deste renomado autor da literatura americana, encontramos uma profunda e tocante reflexão sobre a vida e a luta pela sobrevivência, construída partir das memórias do personagem sem nome, um homem comum, que tantas vezes enfrentou a morte. 

Na retomada das lembranças passadas, por meio de um exercício mental do personagem, que faz um balanço da própria vida e das dificuldades que enfrentou, o autor nos leva pensar sobre questões que podem acometer a todos nós. Isso se dá, por exemplo, quando ele discorre sobre os problemas cardíacos do personagem principal ou de saúde dos seus vizinhos de condomínio, a dificuldade de envelhecer e não mais conseguir fazer o que fazia antes, os laços construídos ao longo da vida, para depois morrer doente e sozinho. 

Utilizando-se de uma narrativa retrospectiva, que foca diversas passagens da vida do personagem, para frente e para trás, como o movimento de uma câmera, permite-nos viajar nas mesmas preocupações e anseios que acometem o protagonista, na luta pela sobrevivência, após já estar aposentado e morando sozinho, em um condomínio de aposentados: a solidão, o medo da morte, o arrependimento por erros cometidos, a angústia e a culpa por achar que é tarde demais para corrigi-los. 

O leitor vê-se plenamente familiarizado com os conflitos psicológicos e físicos enfrentados pelos idosos, caracterizados pela luta contra a dor, a doença e o próprio corpo, que não acompanha seus desejos e a juventude de seus cérebros, o que pode causar grande desconforto, dada a percepção da própria finitude. 

O horror do personagem de ver morrer os amigos, também de idade, à sua volta, faz com que se questione quando será a sua vez e traduz todo o emaranhado de sentimentos e dúvidas quanto a vontade de viver e o preço a pagar, quando não se tem saúde. Lutar por mais um dia ou resignar-se? 

Uma história que emociona, pelo realismo de suas cenas. Até os mais jovens vêem-se forçados a fazer um balanço de suas vidas, refletindo sobre o seu próprio processo de envelhecimento e morte e o de seus pais. Chega-se a certeza de que ninguém está preparado para envelhecer, muito menos para morrer.

Quando isso acontece, abandona-se tudo sem resolver. Mal entendidos ficam sem esclarecimentos; brigas, sem reconciliação; e o doloroso arrependimento, de parte dos que sobram, por não ter corrigido os erros no tempo certo. Somos obrigados a deixar tudo como está, arrumado ou de pernas para o ar, não dá tempo de fazer as malas. A única coisa que levamos são os laços que formamos com as pessoas, por meio das quais poderemos ou não nos perpetuar.