Sinopse: Claudia mora com os pais em Cáli, na Colômbia, em um apartamento tomado por plantas e rodeado por precipícios físicos e metafóricos. O ambiente, exuberante e bem-cuidado, é um contraste, uma oposição à mãe indiferente que está em conflito com os caminhos escolhidos e impostos para a própria vida. Como muitas famílias, a de Claudia passa por uma crise, e basta o casamento de seus pais estremecer para que ela comece a entender a fragilidade dos limites que mantêm a previsibilidade do cotidiano.
No mês de março/2022 recebi pela minha assinatura da intrínsecos o romance vencedor do Prêmio Alfaguara 2021 Os Abismos, livro da escritora colombiana Pilar Quintana. O mimo foi um poster e 5 imãs de mulheres latinos americanas.
A história
Em um grande apartamento, que muitas vezes parece uma floresta, moram a Claudia mãe, a Claudia filha e o pai e marido Jorge.
A Cláudia mãe sonhava em sua juventude em cursar direito, sonho devido enterrado por seu pai. Após ficar órfã, com grande apoio da mãe, acabou casando com um homem bem mais velho e sendo sustentada por ele. E embora tenha o desejo de oferecer uma educação bem diferente da que recebeu para a sua filha, passa os seus dias na cama lendo revistas de celebridades, dando uma atenção maior para as que tiveram um desfecho trágico, como Grace Kelly.
Havia tantas plantas no apartamento, que nós o chamávamos de a selva.
Ela passa a se sentir mais alegre quando sua cunhada Amelia aparece do nada casada com um homem mais jovem. Gonzalo é vendedor de roupas masculinas, bonito, de corpo definido, e não demora em trocar olhares com ela, enquanto Jorge se dedica quase integralmente ao supermercado, negócio que possibilita a boa vida de todos.
Com a descoberta do caso, Cláudia se entrega nos braços da depressão, o que é acentuado pelo suicídio de uma amiga próxima. O que gera uma mudança de local e uma nova visão para Claudia filha do que é vida e morte, e entre a preocupação e a curiosidade, novos instintos irão aflorar nesta criança de oito anos.
A escrita de Pilar Quintana
Utilizando a narrativa em primeira pessoa quem nos conta os abismos familiares é a menina Claudia de apenas oito anos. A visão infantil exibe o lado mais cruel de uma casa sem amor, onde é comentado que a menina era a bebê mais feia da maternidade, ou é pedido que a mesma se afaste quando esta apenas deseja dar carinho.
Dividido em quatro partes, ela marca mudanças na vida da família, sejam elas grandes ou que exigem atenção. Lá estão a tristeza, o abandono, a depressão e a solidão. O conjunto disto tudo resulta em abismos não só na paisagem, mas entre as pessoas que moram na mesma casa.
Minha mãe sempre estava em casa. Ela não queria ser como a minha avó. A vida inteira me disse isso.
Tudo em um círculo vicioso que faz a menina, ainda tão jovem, ter uma série de preocupações com os pais, ao mesmo tempo que entre as tantas tragédias ouvidas, passa a se interessar ora com medo, ora com curiosidade, pela morte. Levando o leitor mais sensível a uma agonia permanente sobre os atos de todos da família.
O que eu achei do livro...
A escrita fluída e rápida de Pilar Quintana capturou a minha atenção logo nas primeiras páginas, assim como a base do romance. Pois apesar de termos uma narradora criança, a pauta é séria e exige mais do que cuidado e atenção.
Escondida embaixo de sonhos destruídos e uma falta de vontade de fazer qualquer coisa, existe a depressão, que somada ao alcoolismo, pode passar uma falta impressão de apenas uma pessoa que não quer nada com nada. Fica evidente desde as páginas iniciais como a mãe precisa de tratamento para que isso não afete ainda mais a filha no futuro.
Você precisa ficar em cima de mim o tempo todo?!
Achei muito curioso a escolha do mesmo nome para mãe e filha, embora seja comum entre meninos no Brasil, em ambos os casos me faz pensar em algo que oscila entre o ego e a própria continuidade, como se fosse uma forma de se imortalizar. Ao mesmo tempo existe uma dificuldade grande da mãe em compartilhar tempo e atenção com a filha, como se em muitos casos a menina fosse mais um estorvo do que uma maternidade desejada.
É uma leitura que prende do início ao fim, possibilitando ler de forma rápida, no meu caso, pelo menos, os ganchos de um capítulo para o outro me incentivavam a sempre virar mais uma página, para saber o que vai acontecer, já que eu passei a história inteira com um sentimento de desastre iminente.
Saiu roxa. Horrorosa. Colocaram ela no meu peito e eu, tremendo e chorando, pensei: meu esforço foi para isto?
Um alerta importante, por se tratar de depressão, o livro possuí vários gatilhos em relação a suicídio, então se você se sente mais sensível ao tema no momento, talvez a recomendação seja colocar na famosa lista de compras futuras, até estar mais confortável em relação ao assunto.
Se não for o caso, fica a dica para quem gosta de livros que mexem com o psicológico, que colocam as escolhas femininas na roda, que querem conhecer mais escritoras latinas-americanas, ou que simplesmente querem ler.
Os Abismos
Los abismos
Pilar Quintana
Tradução: Elisa Menezes
Intrínseca
2021 - 272 páginas
Esta resenha não é patrocinada, a assinatura do clube citado é pago integralmente pela autora.
Divagando com Spoiler
Esta parte aqui é para quem já leu o livro e quer saber um pouco mais da opinião de quem já finalizou a leitura. Então se você não gosta de saber nenhum detalhe a mais, não siga a leitura. Caso contrário, fique à vontade para descobrir quais foram os ecos que a leitura me deixou após eu fechar a última página.
É interessante como a tensão do livro cresce sutilmente, quebrando percepções e me fazendo rever opiniões sutilmente. Se tudo começa com a descrição cuidadosa do apartamento lotado de plantas até um final totalmente aberto, que me fez ficar remoendo o que aconteceria com mãe e filha.
Baixinha, magrinha, moreninha, conforme minha mãe dizia que ela era quando criança, mas igualzinha ao meu pai. Uma menina feia.
Confesso que inicialmente achei que Cláudia mãe era apenas uma madame preguiçosa, do tipo que nada precisa fazer e não se esforça o mínimo para mexer o mindinho, situação cômoda proporcionada pelo marido, que trabalha feito louco todos os dias da semana, o que explica um pouco da sua falta de atenção com o que acontece dentro de casa.
Esta opinião de certa forma foi fortalecida pelo caso com Gonzalo, pois ela do dia para a noite ganhou vida, passou a levar a filha em passeios para possibilitar os encontros com o amante. Até que tudo foi descoberto e acabou.
Quem é que no meio da noite, de pijama e sem sapato, ia ter a ideia de sair em um bote inflável para dar um passeio pelo mar escuro e revolto?
Se por um lado a tia Amélia mantém o carinho pelo irmão e pela sobrinha, ela se distância da família, enquanto Cláudia filha espera para saber se os pais irão se separar. E aqui Claudia mãe começa a mostrar os sinais da depressão, ao ficar em um quarto escuro, passar a beber mais e se desligar de tudo e a palavra suicídio passa a ser uma decorrência ao longo dos capítulos.
E foi isso que eu achei interessante, conforme novas histórias de mulheres que optam em acabar com tudo encerrando a própria vida se tornam comum, eu esperava, com a mudança de mãe e filha para um lugar recheado de abismos, que Claudia mãe fizesse uma loucura.
Ficar embaixo da cascata era como gritar em uma terra solitária, em um deserto frio, em um páramo.
Mas o que me quebrou foi a Claudia filha jogando a sua boneca preferida no precipício, como se a criança fizesse um teste sobre o que poderia acontecer se ela mesma optasse por aquele caminho, que no início causava apreensão e agora parece seduzi-la.
O episódio parece fazer os pais acordarem e por um breve período direcionarem a devida atenção a filha, mas logo tudo retorna ao normal, já que nem para a mãe e muito menos para a filha é buscado uma avaliação ou iniciado algum tratamento.
Os pezinhos para cima, a cabeça para baixo e os cabelos espalhados, longos e movendo-se como asas.
Ficando realmente para a imaginação até onde as duas iriam em relação ao fascínio que a morte despertava em ambas, principalmente no que se refere a menina, cujas cobranças estéticas já ocorriam de forma nem sempre muito sutil, enquanto tudo ao seu redor era desprovido de apoio.
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