sexta-feira, 26 de maio de 2023

O Passeador de Livros



Sinopse: Uma fábula moderna e atemporal sobre o poder que a conexão entre pessoas e livros tem de transformar a realidade. Do alto de seus 72 anos, ainda é com bastante vigor e alegria que, todas as tardes, Carl Kollhoff sai para entregar os livros encomendados por seus clientes mais especiais. Tão fiel à tarefa quanto os ponteiros de um relógio, o livreiro da tradicional Ao Portão da Cidade percorre as pitorescas ruas da região e, como nas páginas de seus preciosos livros, observa o mundo real e seus habitantes também por uma ótica lúdica e imaginativa.

Foi em Setembro/2023, no mês em que completava quatro anos, que o Clube intrínsecos enviou a sua última caixinha. O livro escolhido para encerrar este projeto da editora intrínseca foi O Passeador de Livros do escritor alemão Carsten Henn. O mimo foi um outro livro da editora e a saudade que eu fiquei das belas edições.

Aos 71 anos Carl Kollhoff não se imagina longe do seu trabalho como vendedor de livros. Solteiro, possui a sua própria coleção em casa. Na livraria dá dica certeiras, treina funcionários e faz um serviço de entrega domiciliar para clientes que não desejam, por diferentes motivos, sair de casa.

Dizem que os livros encontram seus leitores, mas às vezes é preciso que alguém lhes indique o caminho.


Vivendo entre a ficção e a realidade, ele faz uma correlação entre as pessoas que encontra e personagens literários. Então ele faz suas entregas para o sr. Fitzwilliam Darcy e a Sra. Píppi Meialonga, compra suas maças da Rainha da Branca de Neve, aceita o chá do Hércules, e assim por diante. Se perguntarem os nomes reais, ele precisa de um tempinho para ligar os personagens as pessoas.

Mas sua vida começa a mudar com a internação do seu chefe, que é substituído por sua filha, uma mulher que tem ciúmes de Carl, e o aparecimento de Schascha, uma menina esperta, órfã de mãe, que lhe dá o apelido de Passeador de livros.


A escrita de Carsten Henn

Utilizando a narrativa em terceira pessoa, o escritor alemão Carsten Henn conta com muita delicadeza a relação de amor de um leitor e seus livros através da figura de Carl.

Com inúmeras referências literárias, O Passeador de Livros aborda também a questão do envelhecimento, da perda, do uso da literatura para fugir da solidão ou do próprio mundo, de relacionamentos abusivos, de mágoa e de como pequenos atos podem mudar tudo na vida de uma pessoa.

Sou como os ponteiros de um relógio. Parece triste, pois eles sempre percorrem o mesmo caminho e sempre retornam ao ponto de partida.


Pois como uma boa fábula, a jornada do herói Carl e de sua assistente Schascha narrada pelo autor Carsten Henn possui os seus obstáculos, mudanças de rumo, segredos e momentos a serem comemorados. O que faz com que a sua escrita seja leve ao mesmo tempo que instiga o leitor a saber mais sobre os personagens.


O que eu achei de O Passeador de Livros

O Passeador de Livros é o tipo de história que defino como bonitinho, sendo uma mistura de fábula e homenagem a literatura, tornando-o um bom candidato para aquela leitura tranquila de férias.

Com inúmeras referências literárias, que vão do nome dos capítulos, os apelidos dados aos moradores da cidade e os autores citados, é quase impossível não sair com um acréscimo na lista de leituras futuras com as indicações listadas.

Leio para o meu prazer egoísta, por amor às boas histórias, e não para compreender o mundo.


Sobre a história em si, achei triste a dependência do trabalho que Carl tem para dar sentido a sua vida. Assim como eu achei que a relação do Passeador com a filha do melhor amigo - e agora chefe - poderia ser melhor trabalhada. Pois ela claramente não o suporta. É só ciúmes e inveja? Ou existe algo mais?

Também achei que em alguns momentos o livro era um pouco arrastado, mas em compensação ele também é muito sensível, o que conquistou o meu coração, principalmente a Schascha, que me dava vontade de abraçar.

Não estava no clima para uma acompanhante lhe fazendo todo tipo de perguntas erradas - ou, pior ainda, de perguntas certas.


E naturalmente tudo ficou mais sensível por ser a caixa de despedida, pois ao finalizar a leitura, me vi despedindo deste clube de edições caprichadas, que me apresentaram livros que talvez eu não desse atenção ou nem visse ao rolar a página de um site ou em uma livraria. 

Ficando a dica para quem gosta de histórias leves e sensíveis que podem aquecer o seu coração.


O Passeador de Livros
Der Buchspazierer
Carsten Henn
Tradução: Kristina Michahelles
intrínseca
2020 - 208 páginas

Esta resenha não é patrocinada, a assinatura do clube citado - que foi encerrado em setembro/2022 - era pago integralmente pela autora. 

terça-feira, 16 de maio de 2023

Coisas Humanas



Sinopse: Os Farel são um casal poderoso. Jean, aos setenta anos, é um famoso jornalista político francês; sua ex-esposa, Claire, é conhecida por seus ensaios e compromissos feministas. Juntos, eles construíram uma reputação e tiveram um filho, Alexandre, estudante de Stanford, prestigiosa universidade americana. Claire está feliz em um novo relacionamento com Adam, um homem simples, professor de uma escola judaica e pai de Mila, uma garota tímida, que orienta a vida sob preceitos religiosos. Tudo muda na noite em que Alexandre e Mila vão juntos a uma festa. Uma acusação de estupro vai abalar a construção social perfeita da família Farel, ao mesmo tempo em que o drama irrompe com múltiplas e extremas implicações midiáticas e jurídicas no auge absoluto do debate #metoo.

No mês de Março/2023 recebi pela minha assinatura da TAG Curadoria a indicação da escritora Tatiana Salem Levy: Coisas humanas o décimo primeiro romance da escritora francesa Karine Tuil. O mimo foi um objeto de decoração.

Jean Farel é um famoso apresentador de TV, de origem pobre e marcado pela tragédia, que se tornou um homem obcecado pela juventude – a ponto de negar a si mesmo viver com a mulher que realmente diz amar - e orgulhoso de seu próprio poder no meio político francês. Mas apesar de todo o seu prestígio, sente o perigo bater à porta com o novo diretor da emissora que está há tantos anos.

Sua ex-esposa Claire é vinte sete anos mais jovem. A acadêmica feminista que foi estagiária de Bill Clinton se vê em meio a ataques após acusar os imigrantes em um artigo sobre os ataques em massa em Colônia, ao mesmo tempo que se vê retornar as sombras ao abandonar o marido em troca de uma nova paixão.

A extrema deflagração, a combustão definitiva, era o sexo, nada mais - fim da mistificação.


Sua nova paixão é o professor judeu Adam, pais de duas filhas, rompe com as tradições para viver um grande amor. O que faz com que a mãe, ainda traumatizada do atentado a escola judaica em Toulouse, se volte ainda mais para a religião, provocando um rompimento com a filha Mila, que busca no pai uma alternativa.

E nesta busca que os caminhos de Mila acabam cruzando com o do herdeiro dos Farel. Alexandre é o garoto de ouro com ótimas notas, estudante de Stanford, parece destinado ao sucesso, embora a pressão já o tenha levado a tentar suicídio. Mas mesmo um típico modelo da elite parisiense pode se colocar em uma situação perigosa ao misturar drogas e bebida alcóolica, combinação que não apenas colocara a vida de todos os envolvidos de cabeça para baixo, como os transformará em personagens de um espetáculo midiático.


A escrita de Karine Tuil

Utilizando a narrativa em terceira pessoa, a autora Karine Tuil divide o seu Coisas Humanas em três partes nomeadas de Difração, O território da violência e Relações humanas. Tendo como base não só a elite parisiense, como diversos ataques sexuais que se tornaram famosos, os movimentos que se levantaram contra eles, como também a relação com os imigrantes e os ataques terroristas que assombram os franceses até os dias de hoje.

Mas acima de tudo, e esse é a grande sacada do livro, ela torna o leitor parte de um júri de acusação de estupro.

A política e o jornalismo tinham constituído os propulsores de sua existência: vindo do nada, sem diploma, sem contatos, ele escalou todos os degraus;


Após uma breve apresentação dos personagens envolvidos, que terão a sua história complementada no decorrer da narrativa, somos colocados no grande tabuleiro que um tribunal se transforma ao colocar réu e vítima frente a frente, confrontando as suas versões.

E isso torna a leitura ao mesmo tempo densa e instigante, pois está tudo lá, a desmoralização da vítima, a inversão dos papeis, as diferenças sociais e a violência em suas diferentes formas. Tudo descrito de uma maneira a provocar dúvidas em quem está lendo, como ocorre em um júri real.

No meio judeu conservador, o casamento permanecia um ato supremo, valorizado e sacralizado.


Em paralelo a isso ela aborda as diferentes faces dos personagens que são atingidos não apenas em seu âmbito pessoal, como também na necessidade de gerenciar isso nas diferentes mídias. Ampliando a narrativa para um olhar tanto sobre a sociedade moderna como o papel da mulher ao trazer diferentes gerações sejam em confronto sejam a sombra de homens poderosos.

Tudo isso tendo fatos reais misturados a ficção, cujo até o tema central foi inspirado em um caso verídico. Tornando assim a leitura ainda mais próxima da realidade.


O que eu achei de Coisas Humanas

Vou iniciar com o que eu não gostei: a falta de revisão, revelada em capítulos seguidos com palavras repetidas ou sem separação, erros que gritavam na virada das páginas em uma edição que não merecia essa falta de cuidado. 

Em relação a narrativa eu gostei muito da história e dos conflitos apresentados. Sendo um retrato atual da época que vivemos de cancelamentos, desafios dos imigrantes, ataques terroristas, machismo e claro, a questão do estupro.

Sempre tivera relações particulares com seus pais, uma mistura de sincera afeição e desconfiança.


Os personagens são bem elaborados, compondo em suas escolhas, erros, diálogos todo o sentindo do título dado. Confesso ter sentido um pouco de falta do lado da vítima, mas creio que a ideia era justamente essa, o silenciamento indica a diferença de classes, onde os mais simples são invisíveis. Eles não têm voz, seu sofrimento não possui o mesmo tamanho dos das grandes castas, mesmo quando eles são as vítimas.

Motivo pelo qual achei genial a ideia de colocar o leitor como um jurado nesta história, fazendo com quem se entrega a leitura refletir sobre os seus próprios conceitos. Diante do desconhecido, qual é a sua base pessoal para definir o que é verdade? O que o outro precisa ser, ter vivido e como deve ter se comportado para que você acredite na versão dele?

Seus argumentos seriam deformados, truncados, mal interpretados, ela receava o impacto que teriam sobre a opinião pública.


Pois ao autorizar o leitor a julgar, inevitavelmente os detalhes saltam mais aos olhos, lhe é permitido julgar sem se esconder cada um dos personagens, podendo revelar mais dos próprios conceitos do que dos próprios julgados.

De bônus deixo para quem procura por livros com temas semelhantes, a personagem Claire me fez lembrar da mãe de um dos personagens de Eu não sei quem você é, que também aborda estupro e feminismo, mas por outro olhar.

Ele a apagou, contudo, o mal já estava feito, a captura de imagens na tela circulava na internet.


Ficando a recomendação de leitura para quem gosta de temas contemporâneos, de história de tribunal e claro, para quem simplesmente gosta de ler.


Coisas Humanas
Les choses humaines
Karine Tuil
Tradução: Mauro Pinheiro
TAG - Paris de Histórias
2022 - 319 páginas

Ficou interessado em assinar a TAG? Indique o meu código de amigo ANDJ8CMF e ganhe 30% de desconto na primeira caixinha e eu ganho o mimo do mês.
Assinatura integralmente paga pelo autora da resenha.


Divagando com Spoiler

Esta parte aqui é para quem já leu o livro e quer saber um pouco mais da opinião de quem já finalizou a leitura. Então se você não gosta de saber nenhum detalhe a mais, não siga a leitura. Caso contrário, fique à vontade para descobrir quais foram os ecos que a leitura me deixou após eu fechar a última página.

Quem finaliza a leitura sabe que apesar do veredito de acusado, não existe uma frase que afirme com todas as letras que Alexandre estuprou Mila. Há apenas as provas que cada um apresenta, assim como as acusações verbais e exposição do passado de Mila.

Confesso que se eu não tivesse acesso ao antes de tudo e aos detalhes nos pós através do próprio Alexandre, eu poderia ficar em dúvida sobre que decisão tomar. Pois sim, ele é apresentado como um bom rapaz com ótimas notas nos estudos, com o depoimento da ex-namorada, amigos, com os seus traumas e pressões vindo da relação dos pais.

Nascíamos, morríamos; entre os dois, com um pouco de sorte, amávamos, éramos amados, isso não durava muito, cedo ou tarde acabávamos sendo substituídos.


E temos Mila, uma jovem que não queria seguir as regras da religião da mãe, que nesta situação teoricamente estaria livre, que viu o pai ir embora para viver um amor enquanto a mãe se fechava mais. Sendo necessário que se observe seu estado físico e psicológico para analisar que aquilo não é uma armação.

Por isso achei a situação do tribunal bastante complexa e fiquei imaginando as situações da vida real, quando você não se depara com um antes e depois, o quão grande é o risco de se cometer um erro quando as interrogações são lançadas, o quanto se precisa de calma, atenção e se despir de qualquer preconceito prévio para não julgar equivocadamente.

Em dois anos, tudo o que tinha construído se desintegrara sem que ela pudesse fazer qualquer coisa a fim de interromper o processo devastador.


No livro eu acredito que Alex é culpado, logo após o episódio identifiquei um breve momento de culpa e remorso, ao qual ele logo joga para o lado enquanto antecipa a sua saída do país usando os pais como justificativa. Assim como as ações dos amigos indicam que não deve ter sido a primeira vez.

E isso é uma das coisas que faz o livro ser bom de ser discutido, porque a leitura é individual, e cada um pode finalizar com outra percepção. Então se você leu e passou por aqui, me diga, qual o seu veredito em relação ao Alex? Inocente ou culpado? Me conte as suas alegações, adoro ter novas visões neste tipo de narrativa.

terça-feira, 9 de maio de 2023

Longe das Aldeias



Sinopse: Um jovem de dezessete anos, diante da doença da mãe, decide desfazer um passado de mentira e de ilusão a respeito da identidade do pai. As memórias, trazidas pela tia, percorrem os horrores da guerra, a fuga da aldeia e do país, a reconstrução da família em solo brasileiro. Frizero concentra a carga dramática da história no que ela tem de mais importante, que é a complexidade do ser humano, capaz de matar para criar, de mentir para salvar e de perdoar para seguir em frente.

Uma mãe que não se encontra mais no tempo presente leva o filho jovem ao passado junto com os seus delírios. Usando a língua da sua terra, o rapaz acredita ouvir o nome do pai desconhecido antes de ela retornar ao seu sono febril. Fazendo-o recordar de todas as suas incertezas.

Pois o passado de sua pequena família é feito pela sua própria imaginação. É na sua mente que ele deseja a pátria e a gente de sua mãe e sua tia com base nas únicas três fotografias que sobraram de uma fuga apressada durante uma guerra. Em paralelo ele pensa na utilidade de ter uma figura masculina, seja através de irmãos ou do pai desconhecido. Pois assim teria ajuda para manter a mãe em segurança durante as suas crises.

Fiquei mareado por ela o resto da noite, com o nome do meu pai transtornado a minha vigília. Recordar sempre me deixa a boca amarga e o coração oco.


Mas quase duas décadas depois dos acontecimentos cabe a Tia Mirna, a responsável pelo trio que aqui se refugia revelar e complementar as peças faltantes desta história.


A escrita de Robertson Frizero

O autor brasileiro Robertson Frizero escolheu a voz de Emanuel para compartilhar com o leitor em uma narrativa em primeira pessoa as descobertas que faz não somente sobre os eventos envolvendo a sua família, como da sua própria origem em uma história de memórias que o preparam para um futuro ainda desconhecido.

Acompanhado pela tia Mirna, sua mãe Marija e seu amor adolescente Madalena, é sem rebeldia ou explosões, mas com doçura e sensibilidade que o vemos trazer memórias da própria infância e varrer pouco a pouco cada mentira que ajudou as duas irmãs a sobreviverem uma guerra, para se defrontar com a verdade nua e crua, que nenhuma criança estaria preparada para encarar.

Pouco conheço do que quero relatar. Sei apenas o que ouvi dos lábios de mamãe, pedaços de história colhidos nos poucos momentos de ternura da minha infância.


Com capítulos curtos, Frizero consegue unir uma escrita objetiva e forte com gentileza e carinho. O que gera um equilíbrio entre a dor e a tristeza com o perdão e a esperança de viver outro dia, pois já que estamos aqui, vamos sonhar e criar planos. 

Pois mais do que tudo Longe das Aldeias fala de sobreviver as tragédias de uma guerra, administrar suas perdas e efeitos colaterais, e no caso de Mirna e Marija de perder todos os seus pontos de referência. O que torna o feito das duas ainda mais impressionante.


O que eu achei de Longe das Aldeias

Eu ganhei este livro quando assinava as duas modalidades da TAG em um final de ano. E a minha primeira surpresa foi ver o nome de um antigo professor de inglês na capa. A segunda surpresa foi o próprio livro, o primeiro romance de Frizero encanta por seus personagens e escrita.

Pois quando a história começa não há nada indicando o caminho. Temos uma mãe, Marija, doente e vivendo entre lembranças do passado e o esquecimento do presente, uma pequena família de imigrantes onde duas mulheres fugiram de uma guerra de um local desconhecido. e um rapaz que só conhece o restante de seus familiares através das histórias da tia Mirna.

Chegamos a esta terra nova, mas vivemos em um casebre obscuro, ainda no vilarejo antigo dos meus avós.


Mas conforme a tia Mirna resolve aos poucos tirar o véu que esconde o trajeto das irmãs até ali, tanto Emanoel quando eu fomos aprisionados em uma história de muita dor e sobrevivência. Aqui foi a fantasia e a ilusão que mantiveram Marija viva e capaz de criar um menino gerado em meio ao caos da guerra, já que a história real é insuportável de encarar.

E é essa menina que acaba envelhecendo muito mais do que os dezoito anos corridos no período da narrativa que nos faz pensar sobre o porquê devemos lutar sempre pela paz. Pois na guerra não existem vítimas maiores que os inocentes, onde mulheres, crianças e os mais velhos são subjugados pelos métodos mais desnecessários.

Faltava-me a caverna escura para me esconder, por sete dias e sete noites, das memórias reveladas pela febre intermitente de minha mãe.


Por isso a minha recomendação deste livro que é rápido de leitura, mas muito intenso em suas reflexões. Confesso que gostaria de escrever muito mais coisas, mas não quero estragar as descobertas de quem o abrir, pois o risco de spoiler é grande, então só digo: leiam. 


Longe das Aldeias
Robertson Frizero
Dublinense
2015 - 96 páginas


terça-feira, 2 de maio de 2023

Escritores & Amantes



Sinopse: Casey Peabody chega a Massachusetts surpreendida pela morte repentina da mãe e abalada por um caso de amor recente. Sua correspondência consiste em convites de casamento e avisos finais de cobrança. Ex-prodígio do golfe, ela agora serve mesas em um restaurante e aluga um quarto minúsculo e mofado ao lado de uma garagem, onde trabalha no romance que escreve há seis anos. Quando se apaixona por dois homens muito diferentes, seu mundo se parte ainda mais. Escrito com humor, sensibilidade e inteligência, marcas registradas de King, Escritores & Amantes é um romance magnífico que explora o salto assustador e emocionante entre o fim de uma fase da vida e o início de outra.

Como não renovei a minha assinatura da TAG Inéditos, pois sim, como quase todo ser mortal tenho uma pilha de livros para colocar em dia, meu último exemplar recebido foi o de Agosto/2022. A ficção Escritores & Amantes é da escritora norte-americana Lily King e teve como mimo um conjunto de porta copos magnético.

Na cidade de Boston, final da década de 1990, A aspirante a escritora e protagonista da história Casey Peabody parece estar à deriva apenas esperando chegar ao outro lado, ao qual ela não tem a mínima ideia do que seja, desde que tenha uma relação com o livro que ela não só deseja, mas como precisa terminar.

Tem muita coisa em que não posso pensar para conseguir escrever pelas manhãs.


Alugando o depósito de um amigo do irmão, ela vive os seus dias entre procrastinar a escrita do seu livro, cujo início começou a seis anos atrás, seu emprego como garçonete em um restaurante bem movimentado, suas dívidas estudantis e seus casos amorosos. Tudo isso somado a perda recente da mãe.

É quando uma sequência de fatos a faz de aproximar de dois homens muito diferentes em idade e classe social, mas com a mesma paixão pela literatura. Ambos também carregam no olhar perdas de pessoas queridas, mas sua abertura para o novo irá depender da personalidade de cada um e de como Casey precisa de moldar para ficar ao lado deles.


A escrita de Lily King

Utilizando a narrativa em primeira pessoa, a autora Lily King coloca a sua personagem principal Casey Peabody no divã para contar aos leitores o seu cotidiano, os obstáculos que a impedem de progredir na profissão escolhida e nas idas e voltas dos seus casos amorosos. Tudo com detalhes muito fáceis de visualizar cada cena, mas sem ser exagerado a ponto de cansar.

Mas na prática os problemas de Casey e os assuntos abordados na narrativa vão muito mais além, começando pela aceitação a morte da mãe. O impacto do luto recente começa aos poucos, sendo citados entre uma ação e outra, como que para salientar a necessidade de esquecimento temporário que a personagem precisa para seguir em frente. Mas como toda dor, ela é latente e aos poucos vamos descobrindo mais sobre a mulher que foi viajar e não mais voltou.

Era forte, o que quer que houvesse entre nós, denso como ar molhado e o cheiro de todas as coisas verdes prestes a florescer.


Seguindo nos laços familiares, somos surpreendidas pelo pai, um homem que desejava tornar a filha campeã de golfe e agora parece não ter sentimento nenhum por Claire, um relacionamento muito mais marcado pela mágoa do que pelo amor.

A normalidade está com o irmão, que mesmo morando longe consegue ajuda-la, sendo arrumando um aluguel barato no quarto depósito do amigo rico, seja através de conversas.

Na sua vida inteira vai haver homens assim, penso. Parece muito a voz da minha mãe.


E naturalmente toda a dívida estudantil para se formar na área de literatura e agora trabalhar como garçonete. Um lembrete a Claire que a vida adulta começou já faz um tempo, embora muitas vezes ela parece não ter crescido.

Tudo isso tendo como base o amor a escrita, e por isso a autora nos leva para um universo de oficinas, rascunhos de textos, inspirações, organização e claro, toda a busca dentro do caminho editorial para quem deseja publicar um livro.


O que eu achei de Escritores & Amantes

Inicialmente achei o livro chato, com uma vida de desgraça pouca é bobagem, a personagem Claire parecia não ter amadurecido e viver entre o antes e depois dos seus relacionamentos sem futuro.

Mas em determinado momento parece haver uma virada de chave na escrita, e a história passou a ter fluidez para mim, tornando a leitura muito mais envolvente e interessante.

A coisa mais difícil na escrita é imergir todo dia, atravessar a membrana. A segunda coisa mais difícil é emergir.


E foi neste momento que o luto de Casey passou a ser sentido por mim, assim como a sua relação com o manuscrito que precisa ser finalizado, além do nojo ao chef de cozinha que abusa do assédio moral e os dois homens que ela parece orbitar, mas que não fazem o mínimo esforço para participar da sua vida.

Aliás, detestei o viúvo, escritor famoso, pais de dois filhos Oscar, não havia um diálogo sem machismo quando ele está em cena. Já o Silas eu não entendi exatamente para que veio na história.

Naquela semana, vou algumas vezes à biblioteca pública pesquisar sobre Cuba. Toda vez, acabo nas prateleiras de biografias lendo sobre escritores e suas mães mortas.


Motivo pelo qual achei que o título do livro não traduz o seu conteúdo, que está muito mais para as dificuldades de se viver como adulto e assumir todos os seus ônus e bônus, do que para a suavidade que o original propõe. Naturalmente essa é a minha percepção, já que o título junto com a garrafa de vinho me fez pensar em algo mais voltado para uma comédia romântica.

No resumo da ópera eu gostei, e fiquei feliz de não ter abandonado após as cinquenta primeiras páginas, motivo pelo qual recomendo a leitura para quem procura por conflitos familiares, a relação com o luto, os desafios da vida adulta e como sempre, quem simplesmente gosta de ler.


Escritores & Amantes
Writers & Lovers
Lily King
Tradução: Laura Folgueira
TAG - Tordesilhas
2020 - 301 páginas

Ficou interessado em assinar a TAG? Indique o meu código de amigo ANDJ8CMF e ganhe 30% de desconto na primeira caixinha e eu o mimo do mês.