terça-feira, 31 de março de 2020

Estação Atocha



Sinopse: Adam Gordon é um jovem poeta norte-americano que, graças a uma prestigiosa bolsa de estudos, muda-se para Madri com o objetivo de completar um projeto de pesquisa. Adam é um jovem brilhante, porém muito instável, narcisista e frequentemente tomado por um sentimento de alienação de si mesmo. Viciado em cafeína, usuário eventual de haxixe, comicamente inseguro com as mulheres e com forte tendência a se automedicar, Adam se vê mergulhado em uma busca constante por autenticidade, girando em torno dos limites da linguagem.

A linda edição de fevereiro da TAG Curadoria trouxe Estação Atocha, livro indicado pela curadora Marília Garcia. Na história temos Adam, um estudante e poeta que tem uma bolsa para terminar o seu projeto, que é finalizar um longo poema sobre a Guerra Civil Espanhola. Sua professora está sempre tentando envolve-lo em atividades acadêmicas, e ele sempre fugindo, preferindo as festas dos jovens intelectuais espanhóis. 
Quando você vai parar de fingir que está só fingindo ser poeta?
Ben Lerner inicia a sua história, com toques autobiográficos, com o ponto forte do livro: descrevendo a cidade de Madrid. Seu personagem Adam leva o leitor por ruas, museus e pontos tradicionais das cidades de Madrid e Barcelona de uma forma que você se sente caminhando junto com ele.

É através dele que também vemos a reação dos madrilenses a um dos maiores ataques terroristas da Europa: as explosões na Estação de Trem Atocha no dia 11 de março de 2004, às vésperas das eleições presidenciais. 

Ou talvez estivesse passando por uma profunda experiência artística?

O que torna Estação Atocha um livro mais ou menos é justamente o seu personagem principal, que é o narrador da história. Como se estivesse em um divã, tendo o leitor como seu terapeuta, ele nos conta o seu dia-a-dia regado de festas, bebidas, poesia, drogas e mentiras.

Ele me parece uma caricatura de si mesmo, uma caricatura de El Poeta.

O terapeuta leitor pode se comover com que parece ser uma baixo autoestima que o leva a uma aparente insegurança em relação a sua arte e com as mulheres. Mas por algum motivo ele não me convenceu. E explico o motivo.

Eu me sentia muito melhor difamando ambos meus pais, distribuindo igualmente entre eles a responsabilidade por meu fracasso como filho.

Adam utiliza um discurso para agradar os que o cercam ou chamar a atenção para si, para isso ele utiliza o termo fascista para definir o seu pai – embora admita para os leitores que o pai está longe disso -, ele “mata” a sua mãe, se apropria de histórias trágicas alheias, finge não entender espanhol, mas o cômico é quando ele critica o estilo americano para depois se portar como o perfil declarado como típico.

Ele desdenha de grandes obras europeias, como a Sagrada Família, em meio a tragédia ele busca a visão americana do New York Times, existe uma soberba, até mesmo um certo machismo, que coloca todas as atitudes do personagem sob um grande ponto de interrogação. Se ele mente para os que estão ao seu redor, quem garante que ele, como narrador, não está mentindo para nós, leitores? 

Acordei na quinta fase do meu projeto como que em resposta a um estrondo.

Durante a leitura não foram raras as vezes que pensei que além de poeta Adam era um psicopata. E por isso senti muita falta de ter outros narradores, para saber que visão eles tinham do personagem, principalmente Isabel e Teresa, cujos diálogos e ações demostram que elas sabem muito mais sobre ele do que ele pretende demonstrar ao leitor.

Mas para dizer que só tem pontos negativos, o livro também possui partes cômicas, o estilo avoado de Adam, que naturalmente não presta muito atenção ao seu redor e isso piora com o uso rotineiro da maconha, fazem o personagem viver cenas totalmente sem noção, como perder um hotel e passar um dia inteiro procurando pelo mesmo.

Quando você vai aceitar que pode viver nesta língua?

Se vale a leitura? Para viajar pela bela Espanha, sim. Para quem tem aquela visão romantizada de um poeta avoado ou do grande talento, também. Para quem gosta de romances que brincam com a linguagem, pode ser. Para quem busca profundidade ou personagens que te envolvam, talvez não.

Estação Atocha
Leaving the Atocha Station
Ben Lerner
Tradução: Gianluca Giurlando
TAG – Rádio Londres
2011 – 219 páginas

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