quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

A Bolsa Amarela



Sinopse: A Bolsa Amarela é o romance de uma menina que entra em conflito consigo mesma e com a família ao reprimir três grandes vontades (que ela esconde numa bolsa amarela) - a vontade de ser gente grande, a de ter nascido menino e a de se tornar escritora. A partir dessa revelação - por si mesma uma constatação à estrutura familiar tradicional em cujo meio "criança não tem vontade" - essa menina sensível e imaginativa nos conta o seu dia-a-dia, juntando o mundo real da família ao mundo criado por sua imaginação fértil e povoado de amigos secretos e fantasias. Ao mesmo tempo que se sucedem episódios reais e fantásticos, uma aventura espiritual se processa e a menina segue rumo à sua afirmação como pessoa.

Raquel é a caçula de uma família aparentemente classe média, uma menina meio criança meio pré-adolescente que tenta esconder suas três vontades que não param de crescer: de ser grande, de ser um garoto e de se tornar uma escritora.

Estas vontades são alimentadas pelo cotidiano, pela solidão de quem não tem com quem conversar e ouve de quem está na frente da televisão sobre não haver tempo para interagir com ela. Se adaptada aos tempos modernos, seria o smartphone nosso de cada dia.

Vocês podem um monte de coisa que a gente não pode. Olha: lá na escola, quando a gente tem que escolher um chefe pras brincadeiras, ele sempre é um garoto. 

E é justamente nas primeiras páginas que o leitor, independente do tamanho, irá se dar conta que está entrando em um mundo parte real, parte imaginário. Das cartas que ela escreve para seus amigos inventados (e responde em nome deles), até o surgimento da bolsa amarela usada, enviada por uma tia com mais posses, que ninguém mais da sua casa queria. 

Aliás, a grande bolsa acaba se tornando uma companheira inseparável da menina, cujo fecho muito sabido emperra nos momentos que a menina mais precisa, tornando-a praticamente um cofre para esconder aquilo que a família não deve ver.

Vi aparecer uma bolsa; todo mundo pegou, examinou, achou feia e deixou pra lá.

Nas cartas estão perguntas sobre o que ela ouve e não entende, como qual o motivo de uma mãe ter mais um filho se ela não queria mais? Sobre o fato da irmã que deveria cuida-la enquanto os demais trabalham e estudam, mas de além não deixa-la fazer nada - nem mesmo trazer amigos em casa – a deixa trancada sozinha em um apartamento no sexto andar.

Sobre as vontades, todas possuem algum motivo relacionado ao ambiente familiar. A vontade de crescer é para não entrar em conflito com a família e poder tomar as próprias decisões.  Raquel quer ser menino por ter uma criação em que o sexo masculino ser mais incentivado, ter liberdade de brincar de coisas que não são de meninas e, o mais importante, ganham o poder de decisão. E ser escritora por simplesmente gostar de inventar coisas.

Eu ia respondendo e pensando: será que eles acham que falando comigo do mesmo jeito que eles falam um com o outro eu não vou entender?

E de forma simples a menina irá aprender com os próprios conflitos, a dizer suas opiniões e compreender as próprias vontades, que tornam a bolsa amarela leve ou pesada conforme o momento que ela vive e os paradigmas que ela resolve enfrentar.

Considerado literatura infanto-juvenil é um livro que agrada e encanta leitores de todas as idades. Se para o público pré-adolescente a história mostra que não se está sozinho na confusão de sentimentos e frustrações, para os adultos pode trazer lembranças e antigas vontades que ainda pesam em algum lugar, mas que estamos tão acostumados em carregar que nem lembramos mais.

Mas aconteceu uma coisa esquisita: eu não podia parar de falar.

A narrativa em primeira pessoa nos deixa mais próximos da personagem Raquel, sendo fácil pensar por alguns momentos que Afonso, a Guarda-Chuva e o Alfinete são reais. E talvez sejam se deixarmos de lado toda a lógica para se entregar a emoção.

O livro é bonitinho, filosófico, sendo muito fácil e rápido de ler. Lygia Bojunga lançou este livro originalmente em 1976 com fortes influências de outro grande autor infanto-juvenil: Monteiro Lobato. A Bolsa Amarela agradou tanto que acabou se tornando um clássico deste nicho literário, e tirando a questão da figura masculina, ele segue mais atual do que nunca.

A Bolsa Amarela
Lygia Bojunga
Ilustrações Marie Louise Nery
Casa Lygia Bojunga
1976 – 135 páginas

Nenhum comentário:

Postar um comentário