quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

Catarina, A Grande



Sinopse: Catarina, a grande, foi a última mulher a governar a Rússia e deixou marcas sem precedentes no país. Biógrafo premiado, Robert K. Massie recorre a trechos de cartas e diários pessoais da czarina, recriando um mundo de mudanças políticas, arte, guerra, amores e um capítulo fascinante da história russa.

Filha do príncipe Cristiano Augusto de Anhalt-Zerbst com a princesa Joana Elizabeth, Sofia era uma princesa alemã de um reino pequeno em comparação aos grandes impérios da época. Sua vida sofre a primeira mudança quando a imperatriz Elizabeth, filha de Pedro, o Grande, chama a moça com então 14 anos até a Rússia. Prima de segundo grau de Pedro, a jovem parecia ter a docilidade necessária para ser a esposa do futuro Czar.

Ela se sentou no trono de Pedro, o Grande, e governou um império, o maior do mundo.

Em São Petersburgo ela muda de religião, apesar dos apelos paternos, troca o nome para Catarina e se casa com Pedro III, um menino órfão, de ideias perdidas, escolhido para ser o herdeiro do trono simplesmente por ser sobrinho de Elizabeth. Em um casamento infeliz, a segunda mudança de sua vida ocorre após a morte da imperatriz, quando após decisões equivocadas do jovem imperador, ela dá o golpe que a torna a última imperatriz da Rússia.

Fui para o meu quarto ainda chorando e pensando que a morte era preferível a essa vida de perseguição.

O biografo Robert K. Massi nos conta a história de uma menina triste, criada sem amor materno, afastada do afeto mais próximo que era o pai, e colocada a mercê de uma imperatriz e seu sobrinho que tão pouco lhe dão atenção. 

Mas também descreve uma mulher forte, inteligente, leitora voraz, carismática e atenciosa com os demais. Encantando facilmente os que a conhecem, o que abre caminho para que muitas das suas ideias sejam colocadas em prática durante o seu reinado.

Em paralelo temos as guerras por domínios, alianças são feitas e desfeitas em um grande jogo de interesses, jogo este que Catarina aprende rápido, a ponto de se tornar mais russa que o marido imperador ao qual derruba, ganhando o amor do seu povo.

Ficou tão desagradável à vista que meus olhos se encheram de lágrimas, pois naqueles dias eu tentava esconder ou disfarçar tudo o que era repreensível em meu marido.

O livro dividido em sete partes, sendo que a inicial tem a colaboração das memórias da imperatriz, aos quais ela aparentemente não deu seguimento durante o seu reinado (ou não foram a público), e a várias cartas trocadas com intelectuais da época, amantes, e impressões de outros monarcas sobre a forte figura de Catarina.

Particularmente eu achei o início do livro um tanto cansativo, algumas descrições e episódios parecem se repetir, alongado situações que não precisam de tanto reforço. Por outro lado muitas vezes me peguei pensando quem realmente era essa mulher.

A realidade de sua vida diária era diferente, cheia de frustrações, contrariedades e rejeições.

Uma mulher que se sujeita a inúmeras humilhações, que não consegue criar os próprios filhos, que é subjugada, e mesmo assim tem sangue frio e poder de manipulação para virar o jogo e se tornar uma das maiores imperatrizes da história. 

Confesso que durante a leitura me ficou a dúvida se a tomada de poder de Catarina foi movida pela própria sobrevivência, já que seu casamento aparentemente nunca foi consumado, seus filhos eram de amantes e Pedro III já anunciava que outra mulher seria a imperatriz, com direito a ameaçar a jovem esposa com prisão. Ou se seus anos de leitura somado a sua inteligência, fizeram com que o plano já estivesse sendo elaborado antes da morte da imperatriz Elizabeth.

Conseguir aliados contra Pedro III não era difícil, ele nunca deixou de ser germânico, sua admiração pelo imperador Frederico II da Prússia, a quem favoreceu durante o seu curto reinado, o tornou bastante impopular entre pessoas da nobreza, militares e aliados. 

Aliás, nesta biografia, a visão que se tem de Pedro não é exatamente positiva, fazendo crer que ele era um homem mimado, grosseiro e que não havia crescido. Existem pesquisas de historiadores que tentam abrir uma nova página sobre este personagem da história, alegando que era um soberano culto e aberto a reformas democráticas, mas a visão que temos aqui é a de Catarina. 

Sua conclusão era que Pedro, assim como Ivan VI, teria que ficar prisioneiro na Rússia.

Um ponto interessante do livro, é que ele não é apenas uma biografia só de Catarina, mas da própria Rússia. E retornando aos anos de mil e setecentos, nos deparamos com a corrupção de todos, sem exceção, para atingirem os seus objetivos, que vão da conquista de um país a construção de um castelo.

O dinheiro comprava amizades, lealdades e tratados.

O poder aqui não encontra limites, a ponto de a própria imperatriz Elizabeth ter condenado o legítimo herdeiro ao trono desde o início da sua infância a prisão. Os mais fortes venciam, os mais frágeis eram manipulados ou simplesmente tirados do caminho.

Algo que eu desconhecia totalmente e me surpreendeu bastante foi descobrir que a vida dos servos russos era muito semelhante as dos escravos negros na América. Os servos russos não possuíam nenhuma liberdade, pertenciam ou ao Estado, ou a Igreja, ou a indústria, ou a senhores de terra ou a nobres. Eram comprados e vendidos, eram espancados e não possuíam escolhas. A diferença aqui é que a escravidão não ocorria pela cor, mas por serem de origem pobre e analfabeta. 

No livro existe todo um capítulo, justamente chamado de Servidão, que conta a história destas pessoas. Catarina era uma discípula de Montesquieu e Voltaire, conhecia as ideias iluministas dos direitos do homem, e era contra a escravidão. Mas neste ponto, ao estar em uma posição que poderia mudar isso, ela se dobrou. Quem assinou o decreto de emancipação dos servos russos foi o seu neto Alexander II em 1863.

Apesar das crenças pessoais e apreensões de Catarina quanto à servidão, dadas as reações dos nobres presentes na assembleia, ela se absteve de maiores confrontações.

Outro fato que me chamou bastante a atenção foi ver a Revolução Francesa do ponto de vista dos que estavam no poder. Luís XVI é descrito como um homem amável, bem-intencionado, desajeitado e com dificuldade de tomar decisões. A morte do Rei e de Maria Antonieta tiveram efeitos em Catarina. Se antes as notícias circulavam livremente pela Rússia, agora a imperatriz temia que a revolução se alastrasse até o seu império. Gerando assim uma significativa mudança sobre sua crença na liberdade de expressão e pensamento.

A título de curiosidade, o livro também aborda o funcionamento da arma preferida dos franceses durante a revolução: a guilhotina. Em um debate sobre ela ser mais humana ou não em relação as demais armas, e a pergunta se haveria algum traço de consciência segundos depois da cabeça ser separada do corpo.

A biografia é feliz em mostrar desde a infância até a sua morte a vida da imperatriz. Catarina entrou para a história ao trazer da Europa para a Rússia diferentes tipos de arte, construir hospitais e escolas, e de ser exemplo para o seu povo da importância de tomar a vacina contra a varíola. Sendo realmente uma legítima sucessora de Pedro no crescimento da Rússia, e se tornando uma das maiores imperatrizes da história.

Um livro de leitura muito interessante, principalmente para os fãs de história, já que durante um tempo literalmente o leitor se sente vivendo entre os palácios, cidades e ruas do que já foi um dos maiores impérios do mundo.


Catarina, A Grande
Retrato de uma mulher
Catherine the great – Portrait of a woman
Robert K. Massie
Editora Rocco
211 - 639 páginas

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