Sinopse: A jovem Christine divide seu tempo entre os cuidados com a mãe doente e o trabalho burocrático em uma agência dos correios. Até que um convite inesperado de sua tia para encontra-la em um luxuoso hotel nos Alpes suíços tira a garota da vida de privações e a lança em um mundo repleto de prazer, bonança e privilégios. Essa experiência, contudo, mostra-se apenas um vislumbre de alegria, pois logo Christine se vê novamente amargurada em sua antiga realidade. Com uma prosa vívida e elegante, Stefan Zweig faz em Êxtase da Transformação um retrato poderoso da felicidade, da desilusão e das consequências devastadoras da guerra.
Dizem que a ignorância é uma benção. Christine possui lembranças de sua vida antes da primeira grande guerra, quando era ainda adolescente e sem preocupações. Só que houve mortes e empobrecimento na sua família, o que mudaram o rumo do seu destino.
...desde os dias da infância não se sentira tão leve, andar assim, como se estivesse voando: começara nesta criatura humana o êxtase da transformação.
Mas nos dias atuais ela já está acostumada a sua rotina na pequena aldeia austríaca, onde apesar de ter uma irmã, cuida sozinha da mãe doente, e trata com simpatia a todos que vão até a repartição que trabalha nos correios. Ela está com 28 anos, não sabe se é jovem ou velha, e aos poucos, conforme a vida vai melhorando, tenta colocar pequenas distrações.
Tudo muda quando uma tia, que mora nos Estados Unidos, manda um convite para sua mãe visita-la durante a sua temporada pela Europa. Devido a sua doença, vem à decisão de que Christine precisa de umas férias, e é ela quem vai para os Alpes.
...pela primeira vez uma pessoa percebe, por seu contato com o poder supremo, a força das viagens, capaz de revolver a alma, capaz de, com um único rasgo, remover a grossa capa do hábito, e devolver a essência nua e fértil ao correntoso elemento da transformação.
Logo na chegada aos Alpes o primeiro estranhamento, suas roupas simples e empobrecidas a tornam invisível em um mundo de luxo e sobrenomes importantes. Sua tia, percebendo isso, separa algumas roupas suas e a leva para um salão para cuidar do seu cabelo, dando luz a jovem mulher.
Mas a suspeita não a aborrece, pelo contrário, ela sente uma certa disposição maligna de ser chicoteada em seu abandono, de ser maltratada em sua humilhação.
Em um curto espaço de tempo a menina deslumbrada com o enorme quarto, as roupas macias e a comida sem fim dá espaço para uma mulher que esquece a tal ponto do seu passado que muda até de nome, sendo assim respeitada e admirada por vários dos hóspedes do local.
Só que este mundo paralelo acaba, e voltar à realidade não é nada fácil. E a narrativa ganha uma força maior com todos os questionamentos e mudanças que Christine passa, com cenas emblemáticas e diálogos atemporais.
Num minuto a gente está velha, e murchou, e morre, e nada sabe, e nada viveu e nada aconteceu...
Narrado em terceira pessoa, sem nenhuma divisão por capítulo, Stefan Zweig descreve muitos detalhes no início, como forma de situar o leitor o contrastes dos mundos. Da pobreza a riqueza, o leitor consegue sentir o vento gelado, o perfume da madame, o gosto das refeições. Aqui, para não achar que a narrativa é enfadonha, é necessário colocar a imaginação para trabalhar e entrar nos dois mundos, para assim compreender os sentimentos da personagem principal.
Já na segunda etapa, tempos um forte discurso político, onde todos os sistemas são colocados no mesmo saco em uma Europa empobrecida, enfraquecida pela guerra, com fome e trabalho escasso. A divisão social não é justa, e apenas uma minoria consegue manter o mesmo estilo de vida. Existem referências entre a classe média dos que envolvidos com os partidos conseguem melhorar a sua vida mais rapidamente.
O personagem que trás tudo isso é Ferdinand, que saiu jovem e cheio de ideais para lutar na guerra e retornou sem futuro, sem apoio e sem oportunidades. Um espelho de Christine ao relatar sua amargura e seus questionamentos.
...não sou nem comunista, nem capitalista, para mim é tudo a mesma coisa, só o que me importa é a pessoa que eu sou, e o único Estado que sirvo é o meu trabalho.
A curiosidade neste livro é que ele foi encontrado após o suicídio do escritor e de sua mulher, que encontrava-se totalmente decepcionado com o avanço de Hitler na segunda guerra mundial e os rumos da humanidade. Por não haver divisão de capítulos e uma diferença na própria forma de escrita, pode ocorrer a duvida de que se o livro estava realmente finalizado.
Também não lhe conta que ela havia comprado um bilhete de loteria, com o qual ela, como todos os pobres, espera um milagre.
O livro de novembro da TAG Curadoria, indicado pela curadora Ayelet Gundar-Goshen foi escrito entre os anos de 1931 e 1940, sendo publicado somente em 1981 na comemoração do centenário de nascimento de Stefan Zweig. O leitor mais curioso poderá linkar os sentimentos dos dois personagens Christine e Ferdinand ao do próprio autor, com suas perdas e decepções que o levaram a uma decisão tão extrema.
O livro é forte, a leitura reflexiva, e me fez ter vontade de ler mais títulos do autor. Sua escrita tem algo de muito humano e atual.
Êxtase da Transformação
Rausch der Verwandlung
Stefan Zweig
Tradução: Kurt Jahn
TAG Curadoria – Companhia das Letras
1981 – 219 páginas
Vou confessar que saber que o livro não possui capítulos me desanimou. kkk
ResponderExcluirMas vejo que parece ser uma obra sensacional. Acredito que tenha um peso muito forte, até porque as ideologias do autor o fizeram tirar a própria vida. É triste quando a realidade pesa mais que a esperança.
Beijos
Olá, Paloma!
ResponderExcluirMas sabe que não atrapalha a falta dos capítulos, parece haver uma marcação invisível entre alguns capítulos que te permitem parar e seguir depois.
O livro é muito bom e reflexivo, eu pelo menos adorei.
Obrigada pela visita
Beijos