quarta-feira, 13 de março de 2019

Primavera num espelho partido



Sinopse: Primavera num espelho partido é um livro arrebatador, que conta a trajetória de uma família separada pela prisão e pelo desterro, mas que sobrevive graças à esperança. O romance intercala múltiplas vozes narrativas, incluindo a do próprio Benedetti, que vivenciou a violência da ditadura e passou parte de sua vida exilado. Ao entrelaçá-las, o autor compõe um mosaico de impressões e sentimentos, num livro marcante sobre a resistência do amor em tempos sombrios.

Para o mês de fevereiro/2019 a TAG Curadoria enviou para os seus associados a obra indicada pelo escritor brasileiro Julián Fuks.

Durante a década de 1970, em plena ditadura uruguaia, uma família composta de pai, mãe, filha e avô contam a separação devido à prisão do primeiro. Completando a narrativa está um amigo e o próprio autor, que conforme é indicado na sinopse do livro, compartilha suas próprias memórias.

Sempre tem alguém que está pior, como concluía Esopo. E até pior do que o pior, concluo eu.

Santiago é o pai, que permanece preso no Uruguai e escreve cartas para a família que está na Argentina em exílio. É ele o primeiro personagem apresentado, mas não é o único responsável por toda a mudança na vida familiar, visto que a sua esposa também era militante. 

Em terras Argentinas estão os demais personagens, como a mãe Graciela e a filha Beatriz. Mesmo juntas, existe uma distância entre elas, como o fato de Beatriz só chamar Graciela de mãe quando deseja agradá-la. 

É somente quando alguém chega a perceber que uma rua não lhe é estrangeira que a rua para de vê-lo como um estranho.

Narrado em terceira pessoa, a parte de Graciela mostra uma mulher forte, que trabalha e agora se vê cheia de dúvidas com a longa separação. Ao mesmo tempo é a responsável pela parte mais inverossímil do livro.

Já a narrativa da menina Beatriz é uma das mais agradáveis, e ao mesmo tempo reais em relação aos personagens. Sua visão está na saudade e nas mudanças, no que ela percebe e no que ela imagina, rendendo alguns momentos cômicos na história.

As notícias do rádio não somente não eram tediosas, como nos bons tempos, às vezes chegavam a ser arrepiantes, já que em janeiro de 1975 costumavam aparecer dez ou doze cadáveres diários nas lixeiras portenhas.

O pai de Santiago, Don Rafael, compartilha com o leitor suas dúvidas, histórias e culpas. Entre a nostalgia e a atualidade, parece que as cartas acabam aproximando mais pai e filho, já que aqui também há um distanciamento parental, antes muito maior que a distância física.

Fechando o quinteto temos o amigo Rolando Asuero, o solteirão da turma que dá uma ideia de como era o antes de todos os seus companheiros se separem, sejam pela prisão, pelo exílio ou pela morte.

Eu não tirito porque sou menina e não velhinha e também porque me sento perto da estufa.

Entre os personagens, o próprio Mario divide as suas histórias do exílio, usando a narrativa em primeira pessoa e letras em itálico. E na minha opinião, junto com os capítulos de Beatriz, são os mais interessantes. Neles estão suas mudanças de país, as pessoas que encontrava pelo caminho, as mudanças que aconteciam em Cuba em uma visão apaixonada que o socialismo de Che provocava na época.

Mario Benedetti muda o estilo narrativo conforme o personagem, mais do que alterar entre primeira e terceira pessoa, está o uso de cartas – recurso que eu vi sendo utilizado por Amós OZ em seu maravilho A caixa-preta, ou apenas contando o que está acontecendo – recurso utilizado em outro livro que eu acho muito interessante chamado Meu Nome é Vermelho de Orhan Pamuk.

Mas as mulheres sempre tinham fofocas e modas e horóscopos e receitas de cozinha para trocar, pelo menos naquela época, e talvez por isso eles sempre se reuniam à parte para consertar o mundo.

O problema é que esta mistura de recursos nem sempre é muito fácil para o leitor e creio, nem para o escritor, já que a história exige uma atenção extra para seguir cada fio condutor até eles se unirem. No caso de Primavera num espelho partido, em alguns momentos fica a sensação de superficialidade, mesmo tendo um tema tão tenso e que até hoje provoca acaloradas discussões.

Um exemplo é a própria apresentação dos personagens, logo de início você não sabe sobre quem está se falando, fica-se perdido tentando encaixar as peças, tornando assim a intensidade da história secundária. Imaginei que o objetivo do autor talvez você transferir para o leitor o sentimento de estranhamento, de perda de identidade em um local estranho, mas o efeito colateral pode ser justamente um distanciamento dos fatos.

Também deve imaginar que, mesmo que ele e eu tivéssemos tido todas essas discussões em profundidade, ele teria seguido o caminho que definitivamente escolheu de qualquer maneira.

Digo pouca intensidade pelo fato de que a falta de detalhes acaba não criando laços e sim muito mais perguntas sobre eles, parecendo tudo muito ensaiado, sem paixão na escrita. Por isso assumo que apenas literaturei Primavera num espelho partido, que mesmo de leitura rápida não me provocava o desejo de saber o que viria a seguir.

Mas isso não me impede de recomendar o livro. Parece loucura? Pode ser. Mas por outro lado a escrita de Mario Benedetti é fácil, e consegue sim dar uma visão de algumas das consequências da ditadura para quem só ouviu falar sobre ela, e sem saber, vive até hoje os seus efeitos colaterais.

Primavera num espelho partido
Primavera con una esquina rota
Mario Benedetti
Tradução: Eliana Aguiar
TAG Curadoria – Alfaguara
2009 – 238 páginas

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14 comentários:

  1. Oi, tudo bem?
    Que pena que você não conseguiu sentir paixão na escrita do autor e que o livro não lhe agradou por completo. Por isso confesso que não sei se leria. Gostei muito que você trouxe todos os lados positivos e negativos da história. Sua resenha ficou ótima!
    beijinhos.
    cila.

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  2. oi!
    Eu adorei a sugestão de livro é bem interessante, já li muito livros relacionados às ditaduras ..

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  3. Parece ser um livro forte que traz ao leitor um golpe de realidade desconhecido por muitos. Gostei de saber dessa tecnica do autor em diferenciar a narrativa para cada personagem.

    Beijos,
    Paloma Viricio💙💫

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  4. Oi,tudo bem ?

    Não conhecia a obra mas gostei bastante da sinopse e proposta assim como os quotes ressaltados. Sem dúvidas é uma ótima indicação de leitura.

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  5. Livros que falam sobre a ditadura faz a gente imaginar como seria aquela época,mais é um livro bastante interessante, quem gosta de livros desse gênero com certeza vai gostar muito, bjs.

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  6. É MT triste quando a história pede uma certa riqueza de detalhes que não é fornecida, talvez por isso não se prendeu tanto.

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  7. Olá Querida, Tudo bem?
    Adorei a resenha, ficou ótima:)
    Estou muito curiosa pra ler:)
    Muito Obrigada
    Bjs Karina

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  8. Essas histórias de exílio acabam comigo, são sempre muito emocionante e cheias de saudade. Amei a resenha e história, certamente darei uma chance a leitura. Beijos

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  9. Sugestão de livro bem interessante para quem gosta de livros desse gênero, ainda não conhecia.

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  10. Olá, tudo bem?

    Eu gosto bastante de obras que tem uma boa escrita e que consigam fluir bem, como é o caso desse. No entanto, essa questão de não criar laços e sim ter mais dúvidas, confesso que me deixa com um pé atrás, pois adoro me apaixonar pelos personagens. Mesmo assim, espero ter a oportunidade de ler.

    Beijos!

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  11. Oi, tudo bem? Lembro de ter lido sobre a ditadura somente no colégio, mas acho interessante conhecer a história de pessoas que viveram esse momento e de alguma forma sofreram com o exílio ou outras represálias. Realmente, muitas famílias devem ter sido separadas tal como nas guerras mundiais. Um abraço, Érika =^.^=

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  12. Oi Andrea, tudo bem?
    Essa é uma obra que se não tivesse lido a resenha não teria dado uma chance, mesmo sabendo que ela não te cativou tanto, vejo que é uma história que traz alguns fatos do período da ditadura Argentina, e gosto de saber mais como foi esses acontecimentos em outros países, embora esse só teremos a visão da família. Gostei da dica.

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  13. Muito bem explicada sua resenha, Parabéns!

    Renir Fonseca

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  14. fiquei curiosa pra saber mais sobre o conteúdo, amo temas assim!

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