Quem começa a contar a sua história é o capitão do exército
britânico Charles Ryder. O período é a segunda guerra mundial. O narrador não
poupa detalhes, seu olhar observador lhe leva para dentro de cada lugar. Mas é
quando ele retorna a Brideshead, castelo pertencente a uma rica e conhecida
família do capitão, agora cedida ao uso do exército, que iremos descobrir quem
ele realmente é.
As paredes da casa iram levar Charles e os leitores ao fim
da sua adolescência. Órfão de mãe. Pai vivendo em um mundo próprio. Sem
religião. Tem o primo Jasper como um grilo falante que aparecia de tempos em
tempos quando ele vai para Oxford.
E se existe um início de tudo é em Oxford. Local onde
conhece Sebastian Flyte, rapaz de família rica, que carrega um urso de pelúcia
e que cativa pela simpatia. Sua personalidade é complexa, parecendo estar
perdido entre os papeis de menino minado e adolescente rebelde. Algo o oprime e
o deprime.
A relação entre os dois é de amor, ciúmes e de um companheirismo
que resulta em isolamento. Sebastian leva Charles até o seu mundo, onde a
ostentação brilha em paredes, pratos e jardins. E o medo do rapaz se concretiza
quando Charles é abraçado pelos outros membros da família, como se isto o tornasse
outra pessoa, um inimigo, um espião.
Chegar neste ponto é essencial, pois Charles é um artista, e
de certa forma, um alter ego do escritor Evelyn Waugh (sim, é um escritor, seu
nome completo é Arthur Evelyn Waugh), e isto torna o início bem cansativo até a
história se desenrolar e o leitor entender o motivo do detalhe do detalhe.
Somente através da família de Sebastian vamos ver um pouco
da famosa satirização de Waugh com a sociedade inglesa, ao mesmo tempo em que
ele nos apresenta a sua fé na igreja católica.
Aliás, o livro me pareceu convergir muito bem com dois
livros que eu havia lido. Em Retrato de Uma Mulher Desconhecida uma das filhas
de Thomas More nos leva ao início do fim do poder da igreja católica sobre a
monarquia britânica e a conversão dos súditos a igreja de anglicana. Aqui, anos
depois, temos uma das poucas famílias tradicionais que seguiram em sua fé,
vivendo com medo dos castigos por condutas inadequadas as pregadas, e buscando
o perdão para sua redenção e entrada no céu após a morte.
Existe também a versão da visão burguesa da guerra dos
mineiros, que e é narrada por uma das famílias da trilogia O Século do Ken
Follet, e aqui não é dada importância pelos personagens, como se fosse uma bobagem
qualquer.
Na história as personagens femininas são fortes, Lady
Marchmain tem uma forte figura matriarcal, sua sutiliza em manipular e enxergar
somente o que quer ver torna a figura amável entre os demais personagens. Julia
é a versão feminina e madura de Sebastian, onde nem mesmo a frieza esconde a
tristeza dos olhos. E Cordelia, a menina esperta e única que o leitor irá
acompanhar da infância a fase adulta.
Livro detestado por alguns, e admirado por outros, eu diria
que vale a leitura. E sim, eu gostei, apesar de não ser muito fã de livros com
muitas notas de rodapé. Passado o cansaço inicial, onde parecia difícil ler
várias páginas em sequencia (e seus capítulos são bastante longos), é possível
se acostumar com o estilo de escrita de Waugh e ficar curioso e até mesmo
indignado com alguns de seus pontos de interrogação.
Minha sugestão: Leia após um livro leve, antes de vivenciar
os conflitos filosóficos, religiosos e sociais de quem passou por Brideshead.
Bônus: Existem filme e série do livro, para quem gosta de
ler e assistir, fica a dica.
Retorno a Brideshead: Memórias sagradas e profanes do capitão
Charles Ryder
Brideshead
Revisited: The sacred e profane memories of captain Charles Ryder
Evelyn
Waugh
Tradução:
M. Alice Azevedo
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Companhia das Letras
1945 – 390 páginas
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