terça-feira, 16 de fevereiro de 2021

Antologia Macabra



Sinopse: Organizada por Hans-Åke Lilja — editor do Lilja’s Library, um dos principais sites do mundo dedicados às obras de Stephen King, no ar desde 1996 —, a coletânea reúne o medo e o horror de treze almas macabras selecionadas a dedo para exaltar o que há de mais sombrio na literatura.

Embora seja raro entre as resenhas do blog, eu adoro um terror, o que tornou esta antologia de contos que celebram um site dedicado justamente a um dos mestres do gênero um dos livros que eu queria ler logo em 2021.

São 12 contos escritos por 13 autores, um deles é escrito em parceria, e vão do psicológico ao terror clássico.

Como não poderia deixar de ser, o primeiro conto é justamente do homenageado Stephen King. Em O Compressor de Ar Azul temos um escritor que aluga uma casa de uma mulher que logo chama a atenção pelo seu tamanho. 


"Estou sempre com a pena a postos", retrucou, rindo para disfarçar a pena que sentiu de si mesmo depois daquela resposta ridícula.


O conto possui algumas curiosidades, existe a história escrita em terceira pessoa, existem anotações que parecem ser do escritor, e existem intervenções do próprio Stephen King. Então não, você não vai saltar da cadeira nem ficar com medo de dormir à noite após ler, mas tem uma ideia de como funciona a criação de uma história.

O segundo conto é resultado da parceria entre Jack Ketchum e P.D. Cacek. Nomeado A Rede, conta a evolução de uma conversa em uma sala de bate-papo da internet entre Andrew e Cassandra. Não sabemos nada sobre eles, somente o que dizem um ao outro, até o clímax da possibilidade de se encontrarem pessoalmente.


E você está certo... às vezes a gente passa meses conversando com uma pessoa sem nunca saber muito bem quem - ou o que - ela é.


Confesso que achei o mais fraco dos doze contos, o tema é super atual, e serve mais como um alerta dos cuidados que devemos ter ao dividirmos informações privadas com estranhos.

O terceiro conto de Stewart O'Nan chama-se O Romance do Holocausto, um escritor que sobreviveu aos campos de concentração e criou uma ficção sobre o assunto. Chamado para ser entrevistado por Oprah, na narrativa em terceira pessoa o leitor pode acompanhar o paralelo entre o que foi real, o que é parte do romance, além dos sentimentos e comportamentos do personagem.


Está acostumado à vida tranquila que leva, enterrando os sentimentos pelo mundo em seus escritos.


Não há um terror trash no conto, aqui ele está no passado, em uma vida diferente do que poderia ter sido, e existe algo mais assombroso do que aquilo que não se viveu ou que se perdeu?

Bev Vincent traz o seu Aeliana no quarto conto. Uma criatura que assume tanto a forma humana quanto a de um ser que fica à espreita, esperando um assassino desovar corpos e assim ela se alimentar. Quando uma mudança ocorre em sua rotina, ela experimenta novos sentimentos.


Ela ama sair para a rua quando a lua está alta no céu, explorando o mundo enquanto procura alguma comida.


Aeliana é um misto de terror sutil e psicológico, cujo andamento da história desperta a curiosidade e até mesmo uma certa torcida em relação ao desfecho. 

No quinto conto temos Clive Barker e seu Pidgin & Theresa, um papagaio e uma tartaruga que são transformados em humanos após um anjo cometer um erro ao levar a alma de Raymond, seu dono, considerado naquele momento um santo.


Primeiro banhou o quarto sem graça com tamanho esplendor de luz beatífica que as testemunhas foram obrigadas a cobrir os olhos e recuar para o corredor encardido.


Enquanto os dois saem para descobrir o mundo em sua nova forma, Raymond passa por uma análise celestial cuidadosa, onde os seus pecados começam a ser revelados, expondo um segundo erro na ação. 

Eu achei a ideia do conto muito interessante, aqui o terror está no comportamento dos personagens, onde o real e o fictício são separados por uma linha tênue.

O sexto e mais dolorido de todos os contos, na minha opinião, é o Fim de Tudo de Brian Keene. Aqui temos um personagem que todos os dias acorda desejando o fim do mundo, as causas para o acontecimento mudam todas as manhãs, mas a dor que o faz desejar que tudo se acabe, não muda em nenhum momento.


Só existe um outro jeito de chegar lá, mas ainda sou covarde demais para ir em frente.


O terror aqui está no que muitos chamam de destino, ou de um infortúnio da vida, situações fatídicas que podem acabar com as motivações de alguém. 

A Dança do Cemitério de Richard Chizmar é o sétimo conto e nos coloca em outro tipo de terror. Aqui temos Elliott Fosse, um homem aparentemente comum, entrando em um cemitério após a meia-noite. Existe um túmulo especifico ao qual ele quer chegar, e aqui são compartilhadas memórias passadas, onde o terror passa pela psicopatia.


O céu estava sem estrelas, cobrindo o cemitério como uma enorme tenda de circo preta.


O oitavo conto nos leva para o clássico do terror, em Atraídos para o Fogo, Kevin Quigley leva o leitor a acompanhar a escapada de três meninos, que desobedecem aos seus pais, para irem em um parque de diversões novo em sua cidade. Ao chegar no local, um estranho os atraí, e que o era para ser diversão e competição de coragem vira uma busca pela sobrevivência.


"Chip, Bobby e Johnny, três rapazes robustos! Será que aguentam alguns sustos?"


É um dos contos mais longo, com direito a sentir o coração bater mais forte se você se deixa envolver facilmente pela leitura.

Seguindo na linha de parques, no nono conto chamado O Acompanhante de Ramsey Campbell o leitor é apresentado a Stone, um homem que em suas férias busca conhecer feiras. No momento ele está decepcionado, por não ter encontrado exatamente o que o guia dissera. Apesar de ser adulto, ele se sente atraído por brinquedos, e isso acaba fazendo com que procure uma velha feira e se interessar por seu trem fantasma.


Por um momento, Stone teve a impressão de estar trancado num quarto empoeirado onde os brinquedos, como nos contos infantis, adquiriam vida.


Puxando para a linha psicológica, somos levados junto a Stone por diferentes caminhos, conhecendo-o ao mesmo tempo que não temos ideia do que irá acontecer.

Como não poderia faltar, o décimo conto é o clássico O Coração Delator de Edgar Allan Poe. Um cuidador pega implicância por um dos olhos do senhor que acompanha e diz amar. Comparando a um abutre, ele começa a elaborar um plano para se livrar do homem.


A doença apurou meus sentidos, não os destruiu, não os amorteceu.


Loucura pura que me fez sentir arrepios, mesmo não sendo a primeira vez que o leio.

Já na reta final, o décimo primeiro conto tem o singelo nome de Amor de Mãe, de Brian James Freeman. Aqui temos Andrew, um filho que ama muito a sua mãe, mas não consegue dar pessoalmente os cuidados que ela necessita, o que lhe traz uma imensa aflição.


A mãe estava só, e Andrew odiava não ficar ao lado dela a cada minuto, mas estava fazendo o seu melhor.


Como um bom filho ele sai em busca de uma clínica de repouso recomendada, da espera para abrir uma vaga, ao parcelamento das taxas de internação, ele é consumido pela proximidade da morte de sua mãe.

Uma história de terror que poderia facilmente estar como notícia real em uma página de jornal.

Para fechar a Antologia Macabra, John Ajvide Lindqvist e o seu O Companheiro do Guardião. Utilizando os jogos de RPG, associado aos famosos bullyings que ocorrem nas escolas, o sobrenatural irá entrar na vida de um mestre nato quando ele brinca com as palavras.


Tinha autoridade, tinha a imaginação. E tinha linguagem.


Sendo um dos mais longos, Lindqvist nos coloca na vida de Albert, de forma que possamos conhece-lo mais intimamente do que os outros, seu egoísmo e dificuldades estão expostos, como grandezas e fraquezas de um jogo.

A edição é muito bonita, da encadernação as ilustrações, a edição da DarkSide me impressionou. A única coisa que achei um pouco incomoda foram as páginas grudadas, que fui soltando conforme evoluía na leitura, como se estivesse folheando algo muito antigo.

A antologia é uma verdadeira amostra de que o terror está além de serras elétricas e apocalipse zumbi. De maneira sútil, ele pode decorrer de uma fatalidade, impulso, lembranças, arrogância e instintos ainda não bem explicados.

Como fã tanto de histórias de terror quanto de contos, eu gostei bastante de quase todos os contos, confesso que apenas A Rede não me conquistou. Ficando a recomendação para quem compartilha o gosto comigo.

Para quem ficou curioso sobre outros títulos da linha Macabra, convido a ler a resenha das Vitorianas Macabras.

Antologia Macabra
Shining in the Dark
Diversos autores
Organização: Hans-Åke Lilja
Tradução: Paulo Raviere
DarkSide
2017 - 242 páginas

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