terça-feira, 19 de outubro de 2021

Aqueles olhos verdes



Sinopse: Em seu novo romance José Trajano nos leva a uma fazenda no interior do Rio de Janeiro, o palco central da vida de Zé Reis. Conhecido pelos imensos olhos verdes e por sua paixão pelo futebol, na fazenda da Forquilha ele funda o Rio das Flores Futebol e Regatas e abre as portas do impressionante casarão - e do valente time amador. Misturando ficção e realidade, Aqueles olhos verdes é um delicioso passeio por festas, culinária, futebol, tradições, música e política do Brasil desde o fim dos anos 1930 até o início dos 1960.

O futebol brasileiro é cheio de histórias e lendas, o que naturalmente pode render biografias, ficções, crônicas ou uma mistura de realidade e imaginação. E é justamente utilizando-se da segunda que o jornalista, comentarista de futebol e escritor José Trajano nos apresenta em Aqueles olhos verdes.


Gordinho, não jogava bem, mas não lhe faltava raça e era um esforçado zagueiro.


Em uma viagem a cidade de Rio da Flores, no Sul Fluminense, o narrador da história encontrou um túmulo cuja inscrição exclama que o futebol deve muito a José Ignácio dos Reis. A curiosidade despertada por essa informação gera os capítulos a seguir.

A história de Zé Reis tem início em sua vida adulta, nos anos de 1938, período em que o Brasil era governado por Getúlio Vargas. Seu irmão mais velho - e seu patrão - Vicente era um integralista, também conhecido como camisas-verdes, grupo que era contra a ditadura do governo de Getúlio, mas a favor de Franco na Espanha.


O fracasso do golpe ocorreu principalmente pelas enormes trapalhadas protagonizadas pelos integralistas.


Apesar de aplaudir o atual governo, Zé Reis acompanha os camisas-verdes e inclusive atende o seu líder após uma tentativa de golpe sem sucesso. Mas o que importa para ele é o futebol, e nestas aventuras ele tem a possibilidade de assistir a um Fla-Flu no Estádio dos Laranjeiras enquanto o grupo observa a passagem que há no lugar e leva diretamente até o Palácio que é moradia do presidente.

Neste mesmo ritmo ele tem a possibilidade de se mudar para Rio das Flores e gerenciar a fazenda do irmão, onde também ele precisa abrigar opositores perseguidos enquanto verifica o que a fazenda pode produzir. Logo ele acaba integrando a comunidade local, se apaixonando e casando com Jandira, e participando do time da cidade, que consegue virar sensação no campeonato carioca durante um curto espaço de tempo e recebe visitas ilustres.


Achava estranho Zé Reis, o administrador, se casar com moça negra, família humilde, empregada da fazenda.


E é nesta mistura de história e futebol que fatos como a segunda guerra mundial, inauguração da TV Tupi e do Maracanã, o suicídio de Getúlio e a transmissão da primeira copa do mundo se misturam, sendo somados a episódios pitorescos, algumas vezes cômicos, que se não foram inspirados em fatos reais poderiam muito bem passar como verdadeiros.

Além disso estão curiosidades do dia-a-dia dos próprios brasileiros da época, que vão de pontos turísticos do Rio, passando pela casa de candomblé em Duque de Caxias até o teatro de revista de Eva Todor.


Na eleição de 1945, as mulheres votaram pela primeira vez para presidente.


Narrado em terceira pessoa, como se alguém conversasse com o leitor, o livro tem o seu texto distribuído bem ao centro, com letras de bom tamanho, o que pode agradar principalmente aos leitores mais velhos que já não conseguem ler de perto tão bem assim. José Trajano se utiliza de livros, jornais, revistas e experiências próprias para contar a história de Zé Reis, tudo referenciado em um capítulo final, para quem tiver curiosidade de buscar por mais.

Há também uma curiosidade, o nome do personagem é uma homenagem do autor ao seu avô, que também gostava de boa conversa, contar histórias e andar a cavalo, só não era fã de futebol como o neto.


Houve intensas e acaloradas discussões na Câmara de Vereadores sobre a construção do Maracanã por causa da Copa do Mundo.


Aqueles olhos verdes pode agradar principalmente os fãs de futebol, principalmente do carioca, já que se tem uma boa visão dos acontecimentos até o início dos anos de 1960. Grandes nomes do futebol nacional e internacional viraram personagens na história, fornecendo todo um contexto sobre como os campeonatos funcionavam na época, as excursões que os times realizavam, além é claro da influência política.

Aliás, além das referências citadas pelo autor, eu ouso indicar para quem ficar curioso sobre as sucessões políticas no Brasil a biografia do Chatô, o dono da citada TV Tupi na história, onde há um paralelo sobre as relações da imprensa com o poder.


Zé Reis, como fazia ao receber notícias tristes, saiu pela entrada e não voltou naquela noite para casa.


Confesso que eu particularmente não sou uma entusiasta do futebol carioca, não torço para os times do Rio e nem acompanho, mas a parte do contexto histórico realmente me chamaram a atenção, pois foi uma forma leve de rever alguns fatos políticos do nosso passado um tanto recente, que parecem se repetir de tempos em tempos e cujas decisões ecoam até hoje entre eleitores e seus representantes.

Ficando a dica aqui no blog, principalmente para os aficionados pelo esporte que é paixão não só no Brasil, mas também em diversos países do mundo.


Aqueles olhos verdes
José Trajano
Alfaguara
2021 - 242 páginas

Esta edição faz partes dos livros recebidos pelo Time de Leitores 2021 da Companhia das Letras, cuja resenha é independente e reflete a verdadeira opinião de quem o leu.

3 comentários:

  1. É um ótimo livro que vem com uma mistura de futebol, culinária, cultura, não sou fã de futebol, mas torço pro Vasco da Gama, é uma boa sugestão de livro, bjs.

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  2. Oi, tudo bem? Ah, não conhecia o livro mas gostei bastante da ambientação e período histórico escolhidos pelo autor. Também gosto quando a história lembra o RJ dos anos 60. Um abraço, Érika =^.^=

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  3. Ainda não conhecia esse livro, mas deve ser uma leitura bem bacana para quem gosta de futebol em um contexto mais histórico e político.

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