domingo, 15 de julho de 2018

Chatô - O Rei do Brasil



Sinopse: Biografia do proprietário de um império de quase cem jornais, revistas, estações de rádio e de televisão. Figura carismática e intempestiva, Assis Chateaubriand teve uma trajetória indissociável da vida cultural e política do país entre as décadas de 1910 e 1960.

No velório de Assis Chateaubriand o diretor do MASP Pietro Maria Bardi coloca na parede três obras do museu: Banhista com o cão grifo de Renoir, Retrato do cardeal Cristóforo Madruzzo de Ticiano e o retrato de d. Juan Antônio Llorente de Goya. Sua justificativa era de uma última homenagem, pois “Nesta parede estão às três coisas que ele mais amou na vida: o poder, a arte e mulher pelada”.

Para quem quer um resumo do homem considerado um dos reis do Brasil, transcrevo as palavras do arcebispo de Olinda e Recife Hélder Câmara:
De Chateaubriand se pode dizer o melhor e o pior. Haverá quem diga horrores pensando nele, mas como não recordar as campanhas memoráveis que ele empreendeu? Dentro do maquiavélico, do chantagista, do cínico, o Pai saberá encontrar a criança, o poeta. Deus saberá julgá-lo.

Em quase 700 páginas Fernando Moraes inicia a biografia atendendo ao desejo de Chatô, em seu delirante piquenique onde ele e a filha completamente nus se alimentavam de bispos portugueses antes de ir para a sua hospitalização, onde deixou de ser um nome e virou um corpo.

No capítulo seguinte retornamos para o ano de 1892 e entramos na casa dos descendentes de José Bandeira de Melo, um homem que admirava o poeta e pensador francês a ponto de transforma-lo em sobrenome da família.

Única criança no meio de tantos adultos, ele levantou-se a um sinal do pai, caminhou até a mesa do maestro e repetiu a mensagem inteira. Sem esquecer, sem gaguejar e sem molhar as calças.

Da infância a vida adulta, o leitor não é levado apenas fatos de um dos homens mais influentes do Brasil, como todo o cenário político de décadas e décadas, cujo comportamento político se reflete até hoje na vida dos Brasileiros.

Um ciclo vicioso de um relacionamento que ia da troca de favores a perseguição, verdades e mentiras jogadas em um mesmo cesto em uma relação maliciosa entre o jornalismo e a política.

Acha que andando de bonde e fazendo vida de classe média inspiro confiança aos acionistas da futura gazeta? O carro próprio é hoje o melhor índice de prosperidade.

Nascido no nordeste brasileiro, Francisco Chateaubriand tem a seu favor o amor pelas artes, o acreditar em si, a luta pelos objetivos. Um homem com uma visão a frente do seu tempo, que buscava novas tecnologias, que usou o marketing de uma forma ainda desconhecida, que deixou os diários associados para um grupo de funcionários. Que mesmo sem falar e andar não abandonou a escrita, suas opiniões e esperanças pareciam nunca serem abaladas.

Contra está o seu lado manipulador, vingativo, um homem que usava a caneta contra quem ousasse contraria-lo ou dizer não. Que mudava a lei para se beneficiar. Um homem que não poupava métodos nem violência. 

Foi também graças a Getúlio, de outra feita, que Chateaubriand deu em primeira mão uma notícia da área militar que nenhum jornal tinha.

Em suas extorsões e ameaças, o modos operantes de Chatô é sempre o mesmo. Para mim ele não é uma figura que desperte simpatia, e para os que tem fé, pode-se dizer que ele pagou em vida as suas maldades. Pois sim, o jornalista, advogado e político não possuía dó de suas vítimas. Sabia como ninguém virar o jogo em seu favor. Mesmo quando perdia, conseguia ganhar.

Mas sua história pode cansar, e as mais de setecentas páginas não foram realmente completadas por mim. Pulei frases e capítulos ao me entediar com tanta sujeira, um eco do que vemos nos dias de hoje.

Aquele não era mais o Chateaubriand que infligia pânico aos poderosos - e isso valia também para a fila de credores oficiais que se acumulava fazia décadas.

Também me peguei repensando o que usamos como verdades. Chatô parece ser uma das origens das famosas fake news, onde páginas de grandes jornais eram usadas para espalhar difamação ou favorecimento. E o que é verdade e o que é mentira nos dias de hoje? Interesses continuam em jogo, grandes famílias ainda guardam seus monopólios, o jogo entre imprensa e políticos parece ainda estar rolando. Em quem acreditar? 

O próprio livro pode fazer o leitor se interrogar. Será tudo verdade? Haverá fantasia? O homem preconceituoso, egoísta e extremamente influente era real em sua totalidade? Ou parte da sua imagem foi construída com base em histórias da carochinha?

Nunca saberemos.

Chatô – O Rei do Brasil
Fernando Moraes
Companhia das Letras
1994 – 732 páginas

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