Sinopse: Nella Rogers está cansada de ser a única funcionária negra da editora Wagner Books. Quando já não aguenta mais se sentir deslocada e lidar com as micro agressões no ambiente de trabalho, o destino parece enfim presenteá-la com uma aliada: outra garota negra, Hazel, passa a trabalhar na baia ao lado da sua. Porém, à medida que Hazel ganha influência e atenção no escritório, Nella vai se sentindo deixada de lado. É então que bilhetes misteriosos começam a aparecer em sua mesa, com um aviso: SAIA DA WAGNER. AGORA. Sem saber quem está por trás das mensagens hostis, Nella entra em uma espiral de obsessão e paranoia. E, conforme outras situações desconfortáveis passam a dominar seus dias, a jovem vê sua rotina ser tomada por um clima de pesadelo e percebe que pode haver muito mais em jogo do que apenas sua carreira. Com uma narrativa inteligente e fora do comum, Zakiya Dalila Harris apresenta em A outra garota negra uma crítica social necessária e um thriller capaz de envolver os leitores em uma onda de expectativa até o fim.
No mês de agosto/21 recebi pela minha assinatura da intrínsecos o livro de estreia da escritora norte-americana Zakiya Dalila Harris A outra garota negra. O mimo foram post-it com reações literárias com expressões tipo chocante, amei e ai, que medo. É um dos mais simples do ano, mas depois de já receber três livros extras nem reclamo.
A história começa em 1983, uma mulher está fugindo de Nova York e não deseja ser reconhecida, o seu nome e o motivo de tanta preocupação é desconhecido. Pulamos para 2018 na mesma Nova York, mas agora no escritório da Wagner Books. Nella sente um cheiro diferente que a faz ficar curiosa, pois tem cheiro semelhante a um produto de cabelo por ela usado.
Minha recompensa foi um momento de alívio prazeroso, seguido por uma onda familiar de dor seca e intensa.
Nella é editora assistente e única negra a trabalhar na editora, filha de um casal classe média, ela se criou em Connecticut, estudou com pessoas brancas durante a sua vida inteira, e há pouco tempo desistiu de alisar os cabelos e assumir o seu aspecto natural.
Desde que chegou a editora tenta colocar a pauta da diversidade, mas seus colegas não demonstram muito interesse, então a chegada de outra garota negra lhe deixa extremamente feliz e automaticamente passa a confiar nesta mulher que mal conhece, mas já considera irmã.
Se não tivermos cuidado, 'diversidade' pode se tornar só mais um item que as pessoas têm que ticar de uma lista para depois descartar, algo superficial e sombrio sem nada mais além.
Hazel é simpática, usa dreads, mora no Harlem, demonstra ter interesse em tudo e fazer amizade com todos. Tem um projeto social para jovens escritoras negras e consegue criar laços com pequenos e delicados gestos de atenção. A perfeição da relação começa a apresentar as primeiras rachaduras quando Nella lhe conta a opinião sobre um livro que revisou, cuja personagem negra é extremamente caricata, mas o escritor é uma das estrelas da editora.
O que Nella não imagina é que ao revelar a sua opinião ao autor do livro, sua vida profissional e pessoal começa a ficar na corda bamba, e para desequilibra-la ainda mais, bilhetes mandando que ela vá embora da Wagner começam a aparecer sem que ela identifique a origem.
Eles a tinham ensinado a se manifestar quando algo não está certo e a jamais permitir que alguém a tratasse como se valesse menos.
Em paralelo acompanhamos a vida de duas personagens: Kendra Rae e Shani. Kendra Rae é a editora de um best-seller do ano de 1983 chamado Coração em chamas. Sua parceria com Diana Gordon trouxe uma personagem negra como principal, e este livro é o motivo pelo qual trabalhar na Wagner se tornou o sonho de Nella.
Kendra vive escondida, e somente aos poucos é revelado o que gerou o rompimento com sua amiga e escritora Diana, assim como o fato de ela não desejar mais parecer em público.
Ela havia feito as pessoas pensarem sobre raça, mesmo que não se dessem conta disso, só de estar presente nas reuniões ou confraternizar na copa.
Já Shani tem sua aparição no Harlem, na porta de uma barbearia ela está atrás de Lynn Johnson e a chamada Resistência. Ela foi chamada até ali, após perder um bom emprego para outra garota negra. Com o cabelo raspado e se adaptando a mudança de cidade, ela logo descobre que a mulher que acabou com a vida que gostava também está agindo em Nova York
Utilizando a narrativa em terceira pessoa a escritora Zakiya Dalila Harris tem como foco central Nella e os acontecimentos que vão mudando o rumo da sua vida em 2018, tanto que os seus capítulos, junto com o Prólogo e o Epílogo, são os que não possuem o nome do personagem acompanhado. Nos demais, como forma de situar o leitor, sempre é identificado quem é o foco naquele momento, e são estes personagens que vão pouco a pouco nos dizendo o que está acontecendo na vida de Nella e dando pistas para montar o quebra-cabeça que cerca a história.
Nunca entendi as pessoas que organizavam suas bibliotecas em ordem alfabética; eu só acreditava em organizar a minha por temas - e até isso podia ser difícil.
Como eu não li nada sobre a história antes de iniciar a leitura, confesso que a mudança para thriller me pegou de surpresa, e em alguns momentos me peguei pensando se a autora com uma base tão boa não havia perdido qualidade ao desfocar o que parecia ser o enredo principal, mas como boa brasileira que não desiste nunca, segui até o final e sim, gostei do conjunto quando fechei a última página.
Inicialmente o livro trata a questão da origem negra e racismo. Quais mudanças e palavras ouvidas alguém é capaz de suportar para atender um modelo padrão de comportamento, que teoricamente pode te levar ao sucesso. Situações éticas são levantadas, como o fato de um profissional negro que atua em determinado projeto, seja de publicidade, música, filme ou livro, pode deixar passar uma situação de racismo para o grande público.
'Chegar na hora' é mais um conceito criado e defendido por pessoas que não se parecem em nada comigo.
A própria Nella costuma se questionar, não só por já ter alisado os cabelos e convivido em grupos sociais e escolas majoritariamente brancas, mas também pelo fato de só namorar homens brancos. E com percebe-se que ela também está em busca de se encontrar em suas origens ao mesmo tempo que calibra as suas escolhas.
Também é interessante observar como ela abraça a colega nova em uma ingênua confiança cega, como se a mesma origem garantisse a irmandade automática, o que torna as decepções ainda maiores, já que o seu equilíbrio em relação a tudo ainda é muito delicado.
A única coisa pior do que isso era saber que dezenas, talvez centenas, de outras jovens negras também sofriam esse tipo de humilhação... e que jovens negras eram a causa disso.
Confesso que da metade para o final comecei a achar o mistério que ronda a história meio viajante, mas depois tive o entendimento que se tratava de uma espécie de metáfora sobre o que se abre mão em relação a ideais e crenças para alcançar o sucesso dentro de um padrão amplamente divulgado.
E para quem tem pele branca como a minha, talvez reconheça algumas situações, já que mesmo entre os chamados brancos há uma escala invisível de níveis, com seus próprios desrespeitos, humilhações e mudanças para se adequar aos chamados modelos. O que muda para as personagens que estão no livro e a maioria que vive fora das páginas é que tudo isso é acentuado e agravado pelo racismo.
Qualquer pessoa mais velha que nós ficaria decepcionada de saber que você existe.
E se muito de nós já choramos e sentimos raiva quando somos escanteados sem uma justificativa plausível, quando entra o racismo temos um soco direto na autoestima, como se fazer mais e melhor fosse apenas uma obrigação e não a diferença para ser reconhecido.
A outra garota negra também aborda a questão da diversidade nas empresas, existe uma ironia no uso marqueteiro de poucas pessoas diferentes do chamado padrão para qualificar como uma empresa de braços abertos para todo o tipo de pessoa, desde que, naturalmente, seja apenas um de cada tipo diferente. Mais do que isso já deixa de ser interessante e distorce muito o modelo.
Olhe para você, e pense nisso. Você tem sido realmente você mesma nos últimos meses?
E o mais interessante de tudo é que essa mistura de reflexões e questionamentos são acompanhadas de uma escrita bem fluída, além de ser ambientada de forma contemporânea, onde não se pode usar que as situações descritas aconteciam antigamente, que nos dias de hoje não é assim.
Então fica a dica para quem procura livros com protagonistas negros, quer livros que discutam o racismo dentro do ambiente empresarial, quer ler escritores negros ou simplesmente procura uma boa leitura.
A outra garota negra
The other black girl
Zakiya Dalila Harris
Tradução: Flávia Rössler e Maria Carmelita Dias
Intrínseca
2021 - 384 páginas
Muito interessante a sua resenha! O livro parece ser maravilhoso e eu já fiquei na curiosidade de saber quem estava mandando os bilhetes. haha
ResponderExcluirBeijão! ♥
Relíquias da Lara
Oi, tudo bem? Gente que enredo mais incrível. Fiquei com frio na barriga só de ler a sinopse. Já quero saber quem está enviando esses bilhetes e como terminará a história. Um abraço, Érika =^.^=
ResponderExcluirRacismo sempre é válido ser discutido, é uma ferida ainda aberta na sociedade, mesmo nos dias de hoje, infelizmente. Ótima indicação de leitura =)
ResponderExcluirNossa realmente uma leitura muito boa, o titulo por si já nos deixa curiosa para saber mais sobre a história, arrasou na resenha
ResponderExcluirjá quero ler o livro, amei o conteúdo! sinopse muito top
ResponderExcluirGosto da ideia de abordar temas importantes como o racismo em meio a uma história de suspense, eu infelizmente nunca li algo assim, acho que estou precisando abrir a minha bolha. Fiquei interessada em A outra garota, mesmo não sendo fã de suspense. Beijos
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