terça-feira, 28 de dezembro de 2021

Menino Mamba-Negra



Sinopse: ÁDEN, IÉMEN, 1935. Uma cidade vibrante, viva, cheia de perigos ocultos. E lar de Jama, um garoto de dez anos que se vê sozinho no mundo após a morte inesperada de sua mãe. Para chegar na Somália, terra natal de seus ancestrais nômades, o menino cruza o Mar Vermelho. A guerra está no horizonte e as forças fascistas italianas que controlam parte da África Oriental estão se preparando para a batalha, mas Jama não pode descansar até descobrir se o pai, ausente de sua vida desde que ele era bebê, está vivo em algum lugar. Assim começa uma jornada épica que levará Jama ao norte através de Djibouti, Eritreia e Sudão, países devastados pela guerra, até chegar ao Egito. De lá, a bordo de um navio transportando refugiados judeus recém-libertos dos campos de concentração, o garoto segue através dos mares para a Grã- -Bretanha. Esta história da longa caminhada de um garoto em busca de liberdade também é a história de como a Segunda Guerra Mundial afetou a África e seu povo; uma história sobre sentir-se deslocado e, no fim, encontrar-se novamente.

Em novembro/21 foi o mês temático das caixinhas da TAG, onde os assinantes receberam afronarrativas. Pela minha assinatura da TAG Inéditos eu recebi Menino Mamba-Negra da escritora Nadifa Mohamed - nascida em Hargeisa, Somália - que usou a ficção para contar um pouco das aventuras do próprio pai.

Quando Ambaro estava grávida, aos dezessete anos, ela acabava se separando da caravana devido a sua lentidão. Um dia, cansada demais para seguir caminhando, sentou em uma velha árvore, e enquanto sua respiração normalizava, sentiu algo em suas costas, seguindo em direção ao umbigo. O que parecia ser uma mão se revelou uma mamba enorme, cobra venenosa e muito rápida, que se enrolou em torno da sua barriga. Sem se mexer, Ambaro viu a cobra pousar a cabeça em sua barriga e ouvir a batidas do coração do seu bebê. Depois de um tempo juntos, a cobra simplesmente a deixou, e assim ela passou a chamar o filho de Goode, que significa mamba-negra.


Conto a você esta história para poder transformar o sangue e os ossos de meu pai - e seja qual for a mágica que a mãe dele costurou debaixo de sua pele - em história.


Mas Ambaro e seu Goode - oficialmente conhecido como Jama - tiveram que abandonar a família, indo os dois para um lado e o marido para outro em busca de recursos financeiros para uma vida melhor. Morando de favor na casa de parentes distantes, eles são constantemente constrangidos e destratados.

Por trabalhar doze horas por dia, Jama passa rolando pelas ruas do Áden, sem ir para a escola e brincando com outros meninos. Mas a morte inesperada da sua mãe é o primeiro ato para o seu caminho mudar. Se em um primeiro momento a tia-avó o resgata e o leva de volta para Hargeisa na Somalilândia, mas um novo incidente o faz sair em busca do pai.


Meninos do mercado dos mais diferentes tons, credos e línguas se reuniam na praia para brincar, tomar banho e lutar.


E assim passamos a seguir a vida de Jama de outubro de 1935 até setembro de 1947, em uma jornada por Djibouti, Eritreia, Sudão, Egito e Londres, onde é possível acompanhar a presença de soldados em território africano, os efeitos devastadores da guerra e a reconstrução quando tudo chegou ao fim.


Os Personagens

Jama é o personagem principal da história, mas isso não significa que os outros apenas orbitem ao seu redor, pois apesar de todos os percalços, ele teve vários anjos em sua vida.

Mas é através das suas lembranças que conhecemos o amor de Ambaro e Guure, os pais de Jama, cujos perfis eram muito diferentes dos seus clã, a ponto de Ambaro desafiar a família para se casar com Guure.


Me perdoe, meu bebê serpente, e não viva a vida que eu vivi, você merece coisa melhor.


Já Abdi e Shidani são tio e sobrinho com pouca diferença de idade, crianças que se aventuram nas ruas de Áden com Jama e mais tarde o reencontro em um acampamento militar. Dupla que ganhou o meu coração e o deixou pesado na inútil luta nas montanhas de Eritreia.

Entre os que ajudam, compartilhando um pouco de sua história, estão Jinnow, Idea e Amina, Jibreel e Lorenzo, entre outros, alguns bons, outros que não são exatamente flor que se cheire, mas que de certa forma permitiram a sobrevivência ao longo caminho do menino que vira homem em meio aos obstáculos.


Nenhuma pessoa morre de verdade enquanto há outras que se recordam dela, que têm afeto por ela.


Há também outros personagens de presença marcante que não irei nomear justamente para não estragar a expectativa de leitura, pois mesmo para os mais curiosos é necessário deixar alguns elementos surpresas.

Mas o fato é que ninguém aparece à toa, todos representam um povo, uma determinada situação, um momento da história, enriquecendo ainda mais o relato. Seja por um capítulo ou aparecendo e desaparecendo conforme o vento levava Jama.


A narrativa de Natifa Mohamed

Natifa Mohamed não é somente a escritora, mas também a narradora da história que nos conta, ou como ela diz o griô do seu pai. E com razão, pois a autora a colocou no papel para contar ao mundo as aventuras e desventuras não só do pai-herói, mas também das comunidades que ele percorreu.

Não um herói de espada e capa, ou romântico que arranca suspiro das donzelas. Mas de um menino que sobrevive à miséria, a violência, a humilhação, as perdas afetivas, e mesmo assim segue em busca dos sonhos, do destino dourado prometido e tantas vezes repetido pela sua mãe.


O ar exalava uma corrupção, um aroma misturado de sordidez, suor e fezes de cabra.


E o seu olhar é gentil e poético, as vezes terno em meio a dor. Pois onde a fome e morte se unem o sofrimento pulsa mais forte que as batidas do coração.

Ao mesmo tempo ela nos dá uma visão dos costumes, da existência de hierarquia mesmo entre os mais pobres, a divisão em clãs, as crenças, alguns rituais, as festas e as comidas.


À sua frente, havia as maiores montanhas e colinas que já vira, subindo além das nuvens.


Somado a isso temos uma forte crítica ao colonialismo europeu no continente africano, assim como uma visão forte do comportamento dos vencedores após a guerra com os colonizados e as vítimas do regime nazista.


O que eu achei

Eu gostei muito do livro, me senti viajando junto com Jama pelas estradas, o frio na espinha em cada situação complicada, mesmo sabendo desde o início que ele iria sobreviver, afinal Natifa nos revela logo de início que é o pai quem lhe conta as histórias.

Também achei ele bem escrito, fluído, do tipo que desperta a curiosidade em saber como ele se livrou de determinada enrascada, o que aconteceu após algum incidente, o que Jama havia feito a seguir. 


Queria encostar na barba por fazer do pai, traçar o único rosto que tinha semelhança com o seu.


E talvez por isso a única coisa que me incomodou foi o final, pois como a história termina em 1947 e pelos agradecimentos e local de nascimento da própria autora é possível ver que outras mudanças aconteceram na vida de Goode, o que me deixou com o sentimento de que deveria haver uma continuação.

Fiz uma pesquisa rápida e a princípio não encontrei, mas se alguém souber, por favor, deixe o título nos comentários.


Achava tudo interessante agora, fascismo, comunismo, anarquismo, só conseguia confiar no que era claramente idiota.


E como não poderia deixar de ser, eu naturalmente recomendo a leitura. Com certeza irá agradar quem quer saber mais sobre a África, para quem gosta de uma aventura baseada em histórias reais, para quem fica mais esperançoso ao ler superações, para quem gosta de acompanhar relatos extremamente humanos.

Menino Mamba.Negra
Black Mamba Boy
Nadifa Mohamed
Tradução: Marina Della Valle
TAG - Tordesilhas
2010 - 284 páginas

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9 comentários:

  1. Uma dica muito bacana de leitura. Gostei de sua resenha. Com certeza um livro que nos envolve no contexto do país Africano, de história de superação que nos motiva. Obrigada pela partilha!

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  2. oi logo que vi o título do livro me interessei pelo tema, depois de ler sua resenha, vi que minha primeira impressão sobre o livro foi certa, parece ser uma história vibrante, dessas que nos prende até chegar ao final, é o tipo de leitura que aprecio,amei a dica.bjus.

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  3. É um livro que posso dizer em alguns momentos sofrido, a escrita da autora é bem sentimental, gosto muito de conhecer histórias de outros países, é um livro que vale a pena ler, bjs.

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  4. oi!
    È um livro denso, mas super necessário... achei a escrita dela muito lírica, muito bonita.

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  5. Eu simplesmente amo livros com destaque em pessoas negras e sua resenha me deixou muito curisosa para ler este!

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  6. Oi Andrea, tudo bem?
    Eu consegui sentir pela sua resenha o seu envolvimento com a história. Gosto muito de livros que mexem assim coma gente, que nos ensinam. E acho super importante falar de casos reais de superação, estamos precisando desse sopro de esperança. Dica anotada!
    beijinhos.
    cila.

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  7. Oie, tudo bem? Fico encantada com histórias em lugares assim tão diferentes. Comecei a ler um ambientado no Egito, curiosa para saber mais. Feliz 2022! Um abraço, Érika =^.^=

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  8. Se era pra me deixar curiosa e com vontade de ler o livro, tu conseguiu rsrs, gosto desse tipo de assunto!

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  9. Olá! Tudo bem?

    Eu não conhecia essa obra, mas já fiquei super interessado, pois deve ser uma leitura reflexiva e envolvente. Parabéns pelo post/resenha! Dica anotada!!

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