quarta-feira, 22 de julho de 2020

A Rede de Alice



Sinopse: Neste romance histórico hipnotizante, duas mulheres - uma espiã recrutada para a Rede de Alice, esquema real que ocorreu durante a Primeira Guerra Mundial, e uma universitária americana que busca sua prima ao final da Segunda Guerra - são unidas em uma história de coragem e redenção.

Para escrever este livro sobre mulheres, Kate Quinn foi buscar inspiração em um real esquema de espionagem montado em 1915 chamado A Rede de Alice. Composto em sua maioria por mulheres, o grupo de oito pessoas coletava informações sobre tropas e ocupações alemãs na Bélgica, França e Holanda para os ingleses durante a I Guerra Mundial.
A primeira pessoa que encontrei na Inglaterra foi uma alucinação.

Na versão de Quinn, a Europa tenta colar os seus cacos em 1947 após o final da 2 Guerra Mundial quando a jovem Charlie faz escala na Inglaterra com a mãe. A estudante de matemática está sendo levada a Suíça para um compromisso especialmente delicado para uma família americana endinheirada: realizar o aborto de uma criança sem pai.

Mas a escala não é por acaso, pois o pequeno problema como Charlie chama o seu bebê não é a maior das suas preocupações, contrariando tudo o que dizem as investigações do seu pai, que acredita que a sua prima francesa Rose está morta, ela tem esperanças contrárias e quer descobrir a verdade. Sua certeza é tanta, que ela enxerga a prima em todos os lugares, tornando a busca uma obsessão para ela. Afinal, ela acabou de perder o irmão, ao qual se culpa por não ter conseguido salvar, e isso acentua a necessidade de reencontrar a sua companheira nas melhores memórias da infância.

Uma dama não joga baralho.

Realizando as suas próprias investigações ela chega em um nome e em um endereço. O que a faz fugir da mãe e ir para Londres encontrar Eve Gardiner. A mulher é muito diferente das pessoas com quem está acostumada a conviver: bêbada, com as mãos deformadas e desbocadas, Eve aponta uma arma para a cabeça de Charlie a noite, mas a luz do dia acaba aceitando a oferta do serviço de iniciar as buscas a Rose.

Eve é quem irá levar o leitor através de suas lembranças a 1915, quando é convidada pelo capitão Cameron - personagem baseado em uma pessoa real - para integrar a rede. Acompanhamos o seu treinamento e sua ida a França, quando os desafios da vida de espiã vão exigir o corpo e a alma de Eve, que agora atende ao pseudônimo de Marguerite.

O senhor não precisa do consentimento de ninguém a não ser do meu.

Quem leva estas duas mulheres para percorrer a França é Finn Kilgore, um ex-soldado apaixonado por carros que virou um faz tudo de Eve. Perseguido por suas experiências na guerra, ele também terá a oportunidade de repensar muitas coisas durante a busca de Rose, que acaba se tornando a busca por si para cada um deles.

Dividido em quatro partes, misturando narrativa em terceira e primeira pessoa, conforme a visão que Quinn deseja dar aos seus leitores, A Rede de Alice foi um livro que me encantou. Os obstáculos enfrentados pelas mulheres, começando pela dificuldade de Charlie em sacar o dinheiro da própria conta por não estar acompanhada de um marido, passando pelo desdém de homens que poderiam ter encerrado a primeira guerra muito antes se tivessem acreditado nas informações repassadas por suas espiãs, mostram a força e paciência das mulheres na primeira metade do século XX.

A maioria das mulheres é entediada, porque ser mulher é um tédio.

O livro provoca um misto de sentimentos, principalmente na parte que se refere a Eve e suas companheiras. E isso se torna mais forte ao descobrir que, com exceção da personagem Eve, tanto Louise de Bettignies - a rainha das espiãs - quanto Léonie Van Houtte eram reais. Assim como a tragédia que se abateu na vila de Oradour-sur-Glane, tornando a guerra demasiadamente real para quem nasceu depois dela.

E como um bom livro de espionagem, não poderia faltar um vilão, René Bordelon é um personagem de ficção, mas sua persona sintetiza os aproveitadores e informantes franceses que agradavam os alemães para enriquecer enquanto o restante da população empobrecia. Um homem sem escrúpulos, como muitos que percorreram as ruas na Europa durante as duas grandes guerras.

Somos soldados de vestido, não damas, e precisamos de um maldito cigarro.

E é René que traz a reverência literária mais forte do livro, ao utilizar os poemas de Charles Pierre Baudelaire, o autor parisiense que foi processado por atentado aos bons costumes nos anos de 1800 e um dos percursores do simbolismo e da poesia moderna. Durante a leitura, é muito fácil ter uma relação de curiosidade e ódio pelo poeta, já que ele quase sempre antecede cenas de tensão para Eve.

Um livro forte e envolvente, que leva o leitor pela França referenciando locais, músicas e poesias. E também pelas escolhas de guerra e as cicatrizes que elas deixam no corpo e na alma. O conjunto é uma leitura realmente prazerosa, e para ser ainda mais completa, não deixe de ler as notas da escritora ao final da história.

A Rede de Alice
The Alice Network
Kate Quinn
Tradução: Rogério Alves
TAG - Verus Editora
2017 - 527 páginas

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