quinta-feira, 6 de agosto de 2020

Todo esse amor que inventamos para nós




Sinopse: As casas, aqui, nunca apresentam paredes intactas. Nessas casas, silêncio ferido. As sombras arrastam-se passado adentro, afundam-se nas raízes do que sempre fomos. Nessas casas, o que somos embrenha-se no nascimento de todas as outras e fere nossos modos de porta afora escapar. As casas nasceram em nós de portas abertas.

O livro com 30 pequenos contos foi comprado no escuro, em uma iniciativa da TAG Livros de apoiar as pequenas editoras. O livro do escritor Raimundo Neto foi vencedor do Prêmio Paraná de Literatura e faz uma interessante analogia entre casa e o corpo de seus personagens. 

E a criança nasceu nos olhos abertos da mulher que sonhava.

Escrito quase todos em primeira pessoa, misturam em diferentes momentos uma linguagem rebuscada, poética ou desbocada, dependendo do local onde sua personagem circula ou o que ela estava vivenciando.

As casas aqui pertencem a homossexuais masculinos, e nas páginas há deboches por sua forma de andar, violência, prostituição, relacionamentos escondidos de suas namoradas/esposas, a dificuldade de lidar com as reações maternas e a morte.

Avisou, por telefone, que havia passado na casa para desocupá-la do que era teu, que eu precisava me arranjar com as contas.

Os dos primeiros contos colocam o foco em pessoas trans que possuem o desejo de terem filhos, ao mesmo tempo que tratam prostituição, medo da violência a questão do nome. 

Casa de boneca abre os contos que falam da não aceitação paterna ao homossexualismo identificado ainda na infância. Assim como Maquiada abre a porta com a relação materna, que vai da raiva a surdez, raramente a aceitação.

E a criança gritava tão alto que as bonecas acordavam da vida que não tinham e quase eram felizes no sonho da criança.

Os contos também abordam os que se escondem atrás de namoradas e esposas para viverem seus relacionamentos, viagens inventadas, apartamentos decorados, uma vida dupla e muitas separações. Há também situação de saia-justa, quando uma criança revela a verdadeira opinião de uma amiga.

O problema para mim, como leitora, é a semelhança dos contos. Em alguns momentos eu me sentia em um looping, e ficava em dúvida se as páginas haviam sido desmarcadas e eu havia retornado para uma história já lida. Não sei se isso foi pensando com o objetivo de fortalecer a situação pelos quais as personagens estavam passando, mas o fato é que o sentimento de déjà-vu muitas vezes me convidava a realização da leitura dinâmica.

Eu nunca pedi pra ter um filho como tu.

No decorrer da leitura muitas vezes me peguei pensando se eram os mesmos personagens dando seguimento à sua história. O que me fez cogitar durante inúmeras vezes se no lugar de contos, fosse um romance ou pequenas histórias, tendo diferentes olhares, a casa não seria mais bem estruturada e convidativa. 

Claro que há a influência de gostos, eu sempre associo contos aquela paulada final, que você devora rapidamente e fica sem ar, algo que não encontrei em Todo esse amor que inventamos para nós, onde temos uma narrativa linear, onde o foco está muito mais em tristezas, sofrimentos e separações.

Passamos quase uma vida toda dos nossos trinta e oitos anos tentando desocupar nosso nascimento.

Pessoalmente foi um livro que literaturei, e muitas vezes fiquei com vontade de fechar. Mas como gosto literário é como queijo, cada um tem o seu preferido, fica a dica para quem se interessar.

Todo esse amor que inventamos para nós
Raimundo Neto
Editora Moinhos
2019 - 151 páginas

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