Sinopse: Molly Gray tem dificuldade com interações sociais. Aos 25 anos, a jovem muitas vezes entende errado as intenções das outras pessoas, e sua avó costumava interpretar o mundo para ela, criando regras simples segundo as quais a neta poderia viver. Certo dia, ao entrar na suíte do infame e riquíssimo Charles Black, a vida organizada de Molly vira de cabeça para baixo: além de encontrar os cômodos em completa desordem, a jovem se depara com nada menos que o próprio Sr. Black morto na cama. Antes mesmo que entenda o que está acontecendo, no entanto, seu comportamento incomum levanta suspeitas da polícia, e a camareira, acostumada a passar despercebida, logo se vê presa em uma teia de mentiras e mal-entendidos que não faz ideia de como desfazer. Felizmente para Molly, amigos que ela nunca soube que tinha se unem em busca de pistas sobre o que realmente aconteceu com o Sr. Black. Mas eles serão capazes de encontrar o assassino antes que seja tarde demais?
No mês de fevereiro/22 recebi pela minha assinatura da Intrínsecos o livro A Camareira da escritora canadense Nina Prose. Não confundir com o livro de mesmo título do escritor alemão Markus Orths, que também já foi resenhado aqui no blog. O mimo foi um quebra-cabeça com a cena do crime.
Molly é uma camareira cuidadosa que busca deixar os quartos perfeitos. Ela tem dificuldade para entender ironias e ler expressões faciais, sendo literal em suas interpretações ao interagir com outras pessoas. O que a faz viver com o bullying desde cedo, nunca se livrando desse, mesmo na vida adulta.
Sou sua camareira. Sei muita coisa sobre você. Mas, afinal, o que você sabe sobre mim?
Abandonada pelos pais, foi criada com muito amor e cuidado pela avó materna, ao qual perdeu recentemente e precisa aprender a conviver sem o apoio e conselhos.
Profissionalmente é extremamente cuidadosa e tem orgulho do trabalho que realiza. Mas tem uma vida bastante solitária, sem amigos ou namorado, enquanto sonha em um dia realizar um curso que a ajude a ser promovida dentro da área de hotelaria.
Sou tão grata pelo meu trabalho que acho que estou sonhando todos os dias.
A soma de todos estes fatores a tornam uma vítima perfeita para pessoas que não possuem boas intenções, transformando Molly rapidamente de testemunha a suspeita de assassinato de um cliente costumeiro e rico do hotel.
Os personagens
Molly é a personagem principal, que desperta nos leitores mais sensíveis o desejo de poder entrar na história e protegê-la. Organizada, esforçada, focada e aplicada, sua forma diferente de raciocinar e ver o mundo é ao mesmo tempo envolvente e também um alerta de respeito em relação aos que fogem ao que denominamos de padrão.
A avó, apesar de falecida, é uma personagem onipresente nas lembranças de Molly, já que foram os seus conselhos e as lembranças de muitas conversas que a fazem seguir em frente, aliás, é justamente toda a força que a avó transmitiu a neta que mantém a jovem inteira por mais difícil que seja a situação.
Cometo erros de etiqueta com uma regularidade preocupante, ofendo quando minha intenção é elogiar, interpreto errado a linguagem corporal das pessoas, digo a coisa errada na hora errada.
As senhoras Black são o lado B da riqueza, quando o Sr. Black morre, começa uma guerra pela herança que envolve a Sra. Black atual e a filha do primeiro casamento. Mais do que descobrir o assassino, o que importa aqui é o dinheiro.
Juan Manuel, Sunitha e Sunshine são exemplos de pessoas que saem do seu país de origem para buscarem oportunidades melhores, e assim como Molly, ficam sujeitos aos diferentes tipos de tratamento por parte dos que o rodeiam.
Tantas pessoas que merecem ser punidas nunca são e, enquanto isso, pessoas boas, decentes, são acusadas dos crimes errados.
Já a detetive Stark representa a pressa na resolução, o despreparo em se comunicar com quem é diferente. Algo que abre portas para injustiças terríveis não só na ficção como no mundo real.
Preston e Charlotte são os bons amigos que todo mundo quer ao lado independente se o evento é feliz ou triste, pois eles estão ali para acreditar em você e te apoiar no que der e vier.
Está me olhando como se eu fosse a idiota quando é evidente que ela não é capaz de compreender minha lógica muito simples.
Rodney é o malandro bonito e sem vergonha, que sem escrúpulos envolve e manipula, um perigo para todos que nele acreditam.
Outra de índole bastante duvidosa é Cheryl, a chefe das camareiras que não tem vergonha de entrar antes nos quartos para roubar a gorjeta destinada as colegas e usa o mesmo pano para limpar a pia e a privada dos banheiros dos hóspedes.
Não tem por que ficar sofrendo pela perda de alguém que você nunca conheceu. Já é difícil sofrer a perda de quem a gente conheceu, alguém que nunca vamos ver de novo e que faz uma falta horrível.
E por fim Alexandre Snow, o gerente do hotel que trata Molly com educação e demonstra confiança e satisfação no trabalho que ela realiza com tanto orgulho.
A escrita de Nina Prose
É a própria camareira Molly quem conta a sua aventura em uma narrativa em primeira pessoa, em uma história que a autora Nina Prose optou em dividir pelos dias da semana.
Com escrita fluída, achei interessante que no Prólogo se tem uma ideia da invisibilidade que parece vestir as pessoas que trabalham no hotel, para logo no primeiro capítulo a personagem principal conseguir me levar por um tour descritivo do local escolhido para a cena do crime, onde fui apresentada para um a um dos personagens que participariam do mistério.
Um dia pode ser chocante, e o seguinte também. Mas os dois choques podem ser tão diferentes um do outro quanto a noite do dia, o preto do branco, o bem do mal.
Um ponto muito interessante sobre Molly é que Nina Prose apenas a identifica como uma pessoa que tem dificuldades com situações de socialização. Não há um diagnóstico ou rótulo da personagem, apenas um fluxo que não era igual ao meu de compreender e interagir com os demais.
Para quem gosta de brincar de detetive, a atenção extra é para os detalhes de cena, as lembranças e os diálogos que Molly tem. Pois é muito fácil perceber que ela está sendo enganada, o grande mistério aqui é por quem e como ela irá descobrir.
O que eu achei...
A Camareira é muito mais do que um mistério policial, o livro é sobre as pessoas invisíveis. Exatamente aquelas que cruzam o nosso dia-a-dia prestando os mais diversos serviços e sendo ignoradas por muitos, como se não tivessem importância e tudo se resolvesse magicamente.
Muitas vezes tenho medo de não acreditarem em mim, de descartarem meus pensamentos e opiniões como se fossem lixo. Sou só uma camareira, não sou ninguém.
E por isso muito mais do que descobrir o assassino a minha agonia era em relação ao que faziam com a Molly, a sua solidão, os golpes que ela recebe sem que consiga se defender. Demonstrando uma mistura de fragilidade e força na personagem, tornando-a muito real.
Eu realmente gostei do livro, da escrita, do desenrolar da história. Acho que todas as peças vão se encaixando muito bem e o final não decepciona, fazendo valer muito a leitura.
A Camareira
The Maid
Nina Prose
Tradução: Julia Sobral Campos
intrínseca
2022 - 336 páginas
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