terça-feira, 31 de janeiro de 2023

Anos de Chumbo e outros contos



Sinopse: A estreia na forma breve do autor de incontornáveis romances como Budapeste, Leite derramado e Essa gente. Uma jovem e seu tio. Um grande artista sabotado. Um desatino familiar. Uma moradora de rua solitária. Um passeio por Copacabana. Um fã fervoroso de Clarice Lispector. Um casal em sua primeira viagem. Um lar em guerra. Imersos na elogiada atmosfera da ficção de Chico Buarque, caracterizada pela agudeza da observação e a oposição frequente entre o poético e o cômico, os oito contos que formam este volume conduzem o leitor pela sordidez e o patético da condição humana. Com alusões ocasionais à barbárie do presente, o autor ergue um labirinto de surpresas, em que o sexo, a perversidade, o desalento e o delírio são elementos constitutivos da trama. Em Anos de chumbo, Chico Buarque põe seu conhecido domínio da linguagem a serviço da concisão da forma. O resultado é arrebatador.

O livro de contos de estreia do autor, compositor e músico Chico Buarque veio em uma edição caprichada, em capa dura tendo como imagem a obra Sem título de Solange Pessoa. No interior há oito contos, ao qual faço um pequeno resumo de cada um, sem grandes spoilers, abaixo:

Meu tio conta em primeira pessoa um dia rotineiro de uma jovem que é buscada por seu tio para um passeio. Bem recebido pela mãe, o pai nem se digna a ir de encontro do homem que possui, aparentemente, uma ótima situação financeira e pouca educação.

Meu tio veio me buscar em casa com seu carro novo. Ele não costumava subir, mas dessa vez trazia uma encomenda para a minha mãe.


O passaporte relata a perda do passaporte e passagem para Paris de um grande artista no aeroporto internacional do Rio de Janeiro. Enquanto ele procura, os dois itens são encontrados por uma pessoa que está longe de ser fã da sua obra.

Os primos de Campos é a memória de um jovem sobre a visita de seus primos de Campos desde o início de sua infância e o desenrolar destes laços familiares.

O indivíduo mal acreditou ao ver no documento o nome e as fuças do grande artista que ele mais detestava.


Cida um morador do Leblon conta sobre uma moradora de rua chamada Cida que adotou um banco de praça como sua casa e depende da boa vontade da vizinhança para comer enquanto carrega no ventre uma criança.

Copacabana relata uma sequência de encontros e desencontros de um personagem com figuras como Pablo Neruda, Luís Borges, Ava Gardner e Richard Burton.

Não tenho boa memória remota, pouco me lembro da minha primeira infância.


Para Clarice Lispector com candura o filho de uma professora de artes resolve aproveitar a relação da mãe com a escritora para enviar um maço de poemas manuscritos por ele, mas ao conhecer Clarice pessoalmente acaba irremediavelmente apaixonado.

O sítio em plena pandemia um homem recebe o convite de se isolar em um sítio com uma mulher que acabara de conhecer. Com opiniões em comum, eles criam um mundo próprio sem ver o tempo passar.

Era uma mulher até bonita, apesar da pele rude e dos dentes maltratados; tinha entre trinta e quarenta anos e usava roupas de grife ao sol do meio-dia.


Anos de chumbo retorna a década de 1970 quando um menino com sequelas de poliomielite se apaixona por soldados de chumbo e é super protegido pela mãe e tem pouco contato com o pai, um militar que atua nas prisões de quem é contra o sistema ditatorial.


A escrita de Chico Buarque

O autor brasileiro Chico Buarque usa e abusa das situações cotidianas, como infidelidade generalizada de homens e mulheres casados, paixões não correspondidas, em narrativas que podem ser em primeira ou terceira pessoa.

Por usar personagens muito similares a pessoas que encontramos tanto na rua quanto nas redes sociais, não é difícil associar os perfis descritos com alguém do mundo real ou virtual. Assim como a linguagem utilizada recorda em alguns momentos as próprias redes sociais, dando um ar bem caricato para as situações abordadas.

Parecia um lado avesso de Copacabana, onde os fundos dos prédios ficavam de frente para a rua.


Motivo pelo qual imagino que alguns contos abusam dos detalhes, e outros vão empilhando situações que podem tanto atrair a atenção como tornar a história arrastada demais, outros com aquela cara de lição de moral reduzindo assim o impacto final.


O que eu achei de Anos de Chumbo e outros contos

Eu nunca havia lido nada do Chico Buarque, mas já havia ouvido falar e isso gerou uma grande expectativa que não foi correspondida. Como uma grande fã de livros de contos, confesso que a coletânea do escritor me decepcionou, no geral achei um conjunto de personagens clichês com resultados previsíveis. 

Naturalmente ouve algumas narrativas que eu gostei, mas a média geral ficaria em torno de seis se eu fosse dar uma nota pelo conjunto, e explico o porquê.

Poderia ganhar milhões num desses concursos de conhecimento se a televisão se interessasse por escritores refinados.


Meu tio e O passaporte parecem aquelas fanfics de rede social, achei que o autor pesou a mão na tentativa de fazer algo próximo da realidade, criticando comportamentos padrões da sociedade, e acabou gerando dois contos muito fracos.

Em contrapartida Os primos de Campos, Cida e O Sítio são envolventes pelas suas sutilezas misturada com cenas mais fortes no desenrolar da trama. Dos três O Sítio foi o meu preferido, sendo na minha humilde opinião o conto mais completo e bem desenvolvido.

Era grande a possibilidade de dar tudo errado, mas ela disse que eu não tinha nada a perder.


Na coluna do meio estão Copacabana, uma espécie de conto homenagem aos grandes nomes de diferentes tipos de arte, que imagino era para ser divertido, mas faltou um algo a mais. O mesmo ocorre em Para Clarice Lispector com candura, que parece se perder no decorrer do caminho.

E fiquei sem uma opinião em definitivo com Anos de chumbo, cujo a ideia é boa, o final tem um impacto, mas tem algo no desenvolvimento dele que me incomoda. Fiquei na dúvida novamente se o autor não pesou a mão ao inflar a vida do garoto de desgraça pouca é bobagem, ou por repetir comportamentos já relatados em contos anteriores.

De qualquer modo ele não me faria tanta falta, porque com o tempo aprendi a guerrear sozinho.


Como ainda tenho O Estorvo do autor na fila de livros a serem lidos, vou dar um tempo antes de fazer a contraprova para ver o que eu acho dele como romancista, e quem sabe mudar o meu desagrado inicial.

Seguindo a minha rotina, apesar de ter mais literaturado do que literamado, deixo a indicação, que pode agradar e muito os fãs de Chico Buarque, quem gosta de ver situações tipicamente brasileiras nas narrativas e claro, quem curte contos.


Anos de Chumbo e outros contos
Chico Buarque
Companhia das Letras
2021 - 168 páginas

Esta edição faz partes dos livros recebidos pelo Time de Leitores 2021 da Companhia das Letras, cuja resenha é independente e reflete a verdadeira opinião de quem o leu.

5 comentários:

  1. Ótima a resenha, Chico Buarque é infinitamente incrível, gosto muito de contos, anotado aqui a indicação do livro.

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  2. Oi
    Eu adorei a sugestão é maravilhosa :) sou fã de Chico Buarque

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  3. Oi, tudo bem? Não tinha ouvido falar desse livro mas achei a edição bem bonita, ainda mais por ter capa dura. Interessante ver um cantor escrevendo algo assim, creio que seja uma perspectiva bem diferente de um autor que já atua na área. Fiquei bem curiosa. Um abraço, Érika =^.^=

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  4. Gostei muito da resenha e da indicação, já vou colocar na minha listinha.

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  5. Olá, tudo bem?

    Uma pena que suas expectativas não foram cumpridas e que houve essa decepção, é sempre ruim quando isso acontece. Eu adoro contos, mas quando for ler esse, vou sem esperar muito.

    Beijos!

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